1. No mundo contemporâneo é essencial viver “com os pés no chão”, estar no meio do povo, conhecer a realidade, entender o porquê das atitudes que contrariam toda a tradição. Durante séculos a Igreja convidou os cristãos no sentido de se prepararem para o encontro com Deus na eternidade. A partir do século XIX, porém, com a industrialização e o surgir da questão social, compreende-se que os cristãos devessem estar no coração do mundo, quaisquer que fossem os seus problemas. Apesar da Rerum Novarum de Leão XIII, a Igreja acabou por perder a classe operária. Já no século XVIII, com o racionalismo, muitos grupos de intelectuais se tinham afastado da Igreja. Com Pio X a Igreja aproximou-se das crianças, mas talvez não tenha dado atenção às pessoas que mais deveriam envolver-se na transformação do mundo. Foi já com João XXIII e Paulo VI que a Igreja se reaproximou do mundo. O Concílio Vaticano II foi claro ao dizer que os cristãos tinham o dever de intervir na vida económico-social, na vida cultural, na acção política e na construção da paz. Porque estas ideias não tiveram eco nas comunidades cristãs, com o Maio de 68 em Paris a Igreja acabou por perder os jovens. E na viragem dos anos 70, do século XX, inúmeros cristãos questionaram a sua fé porque não sentiam nela a exigência de uma intervenção social que fosse fermento de esperança. Na viragem do milénio, a humanidade olha para os valores cristãos com a consciência de que só eles podem oferecer um estilo de vida mais voltado para a solidariedade e para a paz. Os sistemas e as ideologias começam a ficar em crise e o tempo dos valores tornara-se um imperativo de salvação. É neste contexto que a Igreja tem o dever de reflectir sobre a sua identidade e a sua relação concreta com o mundo em que se vive. Hoje, o nosso mundo tem características que obriga a Igreja a repensar-se. Não conhecer o mundo, não se aperceber do que ele tem de positivo ou negativo é o primeiro obstáculo à evangelização. Foi a esta presença no mundo que o Papa Francisco chamou “ter os pés no chão”. 

.  Um mundo do provisório e do descartável. Se nada é definitivo, se muita coisa se deita fora, perante a fé também as pessoas se questionam se não é ela provisória e sem sentido. Compreende-se, então, que sobretudo os mais novos voltem as costas até às tradições religiosas, descartando-se completamente delas. 

. Um mundo de comunicação e de informática em que tudo se conhece no momento em que está a acontecer. As redes sociais cobrem o universo, tornam próximo qualquer acontecimento, chegam a entrar na privacidade de cada um, de tal maneira que não há limites para a informação. Para além do que há de positivo nesta proximidade, gera-se um mal-estar que é preciso vencer. 

. Um mundo mediático e de intervenção social que quer ver realizados todos os desejos, positivos ou negativos, desde que respondam a sonhos que é urgente ver concretizados; é um mundo que quer chegar depressa a resultados considerados justos. 

. Um mundo materialista e obcecado pelo dinheiro em que parece ser através dele que se resolvem todos os problemas; daí resultam níveis de corrupção que atingem todas as classes sociais. 

.  Um mundo de facilidade com o crédito a dar soluções, mesmo em questões complicadas; este mundo sacrifica sempre a pessoa e provoca situações difíceis de resolver.

Num mundo assim, é urgente aprender a discernir, para avaliar o que é melhor para a comunidade humana. Os últimos grandes documentos dos Papas, desde João XXIII a Francisco, todos insistem no olhar para o mundo com critérios de Deus. Este olhar não é possível, para o cristão, sem a intervenção do Espírito Santo. Se se quer ir ao encontro do mundo actual só com a força do Espírito é possível discernir as situações, definir os processos e atingir os resultados que são efectivamente razão de esperança.

2. Para saber viver neste mundo, os cristãos têm, então, a força do Espírito Santo que os pode ajudar a separar o que é bom do que é mau, para assim fazerem escolhas, em ordem ao serviço do bem comum. Foi Jesus que nos prometeu o Espírito Santo e, depois, no-lo concedeu: “Eu vos darei o Consolador, diz o Senhor, Ele vos ensinará toda a verdade”. Jesus acrescenta: “o Espírito Santo vos recordará o que Eu vos disse e já esqueceram, e vos ensinará também tudo o que Eu não tive tempo de vos dizer”. Será que os cristãos consideram importante o Espírito Santo nas suas vidas? Um dia o Apóstolo Paulo foi a Atenas e tendo passado no Pártenon, encontrou um altar dedicado “Ao Deus Desconhecido”. O Apóstolo, ao descer para o Areópago, conversou com os sábios e disse-lhes que Cristo era o Deus desconhecido que ele vinha anunciar. Hoje, para os cristãos, o Deus desconhecido é o Espírito Santo. Com os seus sete dons, ilumina a inteligência, a vontade e a sensibilidade afectiva do cristão. 

.  A inteligência humana é enriquecida com os dons da sabedoria, do entendimento e da ciência, para compreender os mistérios de Deus, corresponder às graças que de Deus se recebem e conhecer os dons da natureza, vendo-os com os olhos de Deus. 

. A vontade humana é valorizada com os dons da fortaleza e do conselho, para vencer as dificuldades inerentes à condição humana e tornar mais exigente o ser cristão, bem como o discernimento para as opções fundamentais da vida. 

.  A sensibilidade humana atinge o seu ponto mais alto com os dons da piedade e do temor de Deus, para amar e servir o Senhor em tudo sem condições e reafirmar sempre este amor mesmo com as maiores dificuldades.

Toda a vida cristã é acompanhada pelo Espírito Santo. O nosso corpo é templo do Espírito Santo que habita em nós. Sem a força do Espírito não é possível encontrar a santidade verdadeira. Por tudo isto, como dizia S. Paulo: “Só os que se deixam conduzir pelo Espírito Santo, são de verdade filhos de Deus” (Rm 8, 14).

3. Neste dia de Pentecostes, em que o Espírito Santo se manifestou aos Apóstolos, e por eles a toda a cidade de Jerusalém, pode perguntar-se qual o lugar do Espírito Santo na vida de cada cristão e na vida da comunidade de que faz parte. 

. O Espírito Santo vivo e vivificante dá-nos a vida divina de que nos faz participar. Sem a presença constante do Espírito, dificilmente poderemos assumir ser filhos de Deus. É Ele que dá a vida. 

. O Espírito Santo é santificador. O Espírito é fonte de santidade verdadeira. Ele que é o amor entre o Pai e o Filho faz-se presença de amor total na nossa relação com Deus e na relação com os irmãos. 

. O Espírito Santo revela-se pelos seus frutos. Na Carta aos Gálatas Paulo é de uma clareza extrema: a liberdade do Espírito projecta-se em frutos maravilhosos que fazem toda a gente feliz. O amor, a alegria, a paz, a benevolência e o perdão, o domínio de si próprio são realidades que só podem ser vividas quando se está possuído pela força do Espírito Santo. 

. O Espírito Santo é também fonte de unidade e de paz. Era Francisco de Assis que o exprimia maravilhosamente no seu célebre hino à criação. É pela força do Espírito presente na força do cristão que onde houver ódio se levará o amor, onde houver tristeza se levará a alegria, onde houver guerra se levará a paz. Com a força do Espírito nasce a total comunhão na família, nos grupos de amigos, nas comunidades cristãs, na Igreja inteira. 

.  O Espírito Santo é, finalmente, a presença viva de Deus no coração do homem. Se o Espírito Santo no coração da Trindade é o amor real entre o Pai e o Filho, então, tudo o que é amor no coração humano é presença viva de Deus, pela força do Espírito Santo.

Há na igreja hoje muitos movimentos carismáticos em que se pede ao Espírito Santo os seus dons, os seus carismas, os seus frutos. Independentemente de pertencer a estes movimentos, todo o cristão deve ter como referência no caminho de santidade que percorre, este ideal da caridade que nasce do Espírito, vive do Espírito e pelo Espírito se projecta nos outros e no próprio Deus.

4. A Comunidade Cristã do Campo Grande precisa da presença viva do Espírito Santo, não apenas em cada cristão mas na vida de toda a comunidade. É através da unidade no Espírito que todos vivem a comunhão na caridade

Pe. Vítor Feytor Pinto - Prior