1. Uma das obras de misericórdia espiritual privilegia os conselhos que, na vida de todos os dias, as pessoas podem dar uns aos outros. Não é preciso ser um perito, em matérias complicadas, para dar um parecer sobre um problema. Os pais aconselham os filhos, os professores aconselham os alunos, os juristas aconselham os seus clientes, os amigos aconselham aqueles a quem querem bem, os sacerdotes aconselham os cristãos. Na relação entre as pessoas, há muitas formas de aconselhar. O essencial, porém, está em saber aconselhar, para que as atitudes das pessoas, ajudadas por um conselho, encontrem benefício na decisão que estão a tomar. Perguntar-se-á então, quais as coordenadas de um bom conselho?

. Conhecer bem a pessoa a quem se aconselha. De facto, o mesmo conselho dado a uma pessoa ou a outra absolutamente diferente, pode ser inadequado. Cada um tem características próprias e é a partir delas que se aceita um conselho ou uma sugestão.

. Sentir-se à vontade perante os problemas que estão em causa. Sem ser necessário uma peritagem de especialista, o senso comum é fundamental para avaliar a situação e dar um parecer para uma solução razoável. 

.  Deixar livre a pessoa a quem se aconselha. Um conselho não é uma imposição, um conselho não é uma ordem dada com a autoridade de uma pessoa superior, é uma sugestão que permite ao outro reflectir sobre as várias soluções a encontrar para o problema que está em questão.  

. Admitir outras opiniões, sejam elas próximas ou não do conselho que está a ser dado. De facto, procurar soluções diferentes daquelas que se propõem é uma atitude inteligente para, no tempo da decisão, ter uma visão alargada de caminhos a percorrer.

A obra de misericórdia sublinha a importância de dar bons conselhos. Não são conselhos quaisquer, são conselhos que foram reflectidos, até valorizados pela oração e que trazem consigo soluções coincidentes com os valores evangélicos, a verdade, a justiça e o amor.

2. No mundo actual há inúmeras pessoas que têm opinião sobre tudo e são mesmo intransigentes perante a opinião do outro. Há quem discuta as crises políticas sem ter o menor conhecimento da realidade, seguindo intuições que não têm o menor fundamento. Também há quem se pronuncie sobre as questões fracturantes, em debate na sociedade, sem o menor estudo na vertente ética que essas situações contêm. Nessa altura segue-se, normalmente, o que parece mais fácil. Até no futebol há treinadores de bancada que discutem todos os pormenores dos jogos. Vê-se isto em programas de televisão, em revistas e em outros órgãos de comunicação, parecendo que os comentadores são quem tudo sabe e quem tudo devia decidir. E nem é preciso falar de quantos apresentam as suas opiniões seguindo os interesses pessoais e não as referências éticas ou o bem comum que a todos poderia servir. Há no entanto alguns profissionais que têm como missão orientar outras.. 

. Os juristas católicos dão opinião e aconselham a partir das leis e da sua avaliação ética. Uma coisa pode ser legal e, no entanto, não ser legítima, porque contraria os direitos humanos. É o caso das leis do aborto e da eutanásia. 

. Os médicos e enfermeiros católicos acompanham o desenvolvimento da ciência e da técnica, mas mantém os critérios éticos indispensáveis para conhecer se uma intervenção científica se pode fazer ou não. Pode ser o caso da procriação medicamente assistida, do planeamento familiar e da gravidez de substituição. 

. Os professores católicos estão atentos aos currículos escolares. Se estes contrariam no seu desenvolvimento a mundividência cristã, então exigem uma análise crítica que aponte aos valores cristãos, perante as ideias e os acontecimentos. É o caso da liberdade de escolha dos pais.

. Os pais e mães católicos têm uma responsabilidade acrescida na educação cristã dos filhos, uma vez que são os primeiros catequistas e a referência permanente para as crianças. Estes pais têm uma missão privilegiada na educação completa dos seus filhos.

Se na Igreja aos leigos compete “garantir a ordem temporal e orientá-la segundo Deus, para que progrida e assim glorifique o Criador e Redentor” (LG 31), então eles têm de estar preparados para aconselhar bem e acompanhar melhor aqueles que lhes pedem ajuda

3. Há um aconselhamento que se não pode ignorar: é a orientação espiritual. Até ao Concílio Vaticano II o director espiritual era o confessor e a orientação espiritual fazia-se durante o sacramento da reconciliação. Ora depois do Concílio passaram a ver-se as coisas separadamente: o sacramento da reconciliação tem como objectivo o perdão dos pecados; a orientação espiritual tem como regra dar apoio ao discernimento intenso para as grandes opções de vida. O director espiritual é um conselheiro que ajuda a avaliar as situações e dá em alternativa alguns rumos para a solução dos problemas que se estão a enfrentar. O que pode esperar-se do sacerdote que aconselha? 

.  Que saiba escutar, para conhecer bem o problema, seja ele grave ou mais simples. A escuta é uma arte fundamental na disponibilidade de coração, permitindo compreender, que nada é superficial, tudo é importante. 

.  Que consiga dar a luz necessária, em diversas direcções, para melhor se compreender as alternativas a ter em conta. Em coisa alguma há apenas uma solução para os problemas que estão sobre a mesa. Os vários caminhos a seguir permitem as alternativas indispensáveis às opções a tomar. 

. Que respeite a liberdade do outro para que saiba optar sem atribuir responsabilidades a quem aconselha. Quem é orientado é autónomo e é sempre ele que decide.

Também na vida espiritual e sobrenatural, um bom conselho é indicativo do caminho a seguir na redenção e salvação.

4. Estamos na última Folha Informativa deste ano pastoral. Em breve se vai partir para férias. Este tempo privilegiado de descanso é oportunidade para conversar com muita gente. A tentação por vezes em férias é falar dos outros. Escolheu-se como tema desta última Folha Informativa “Dar Bons Conselhos” para que nos dias de descanso, cada um a seu jeito, ajude todos os outros que se cruzem no caminho. Alguns bons conselhos podem enriquecer as nossas férias. Resta-nos dizermos uns aos outros: boas férias e até Setembro, quando começar o novo ano pastoral.

Pe. Vítor Feytor Pinto - Prior