1. Quem lê os Actos dos Apóstolos encontra na vida de S. Paulo momentos de grande beleza. Depois de ano e meio em Antioquia, onde pela primeira vez os discípulos de Jesus se passaram a chamar cristãos, Paulo segue por todas as cidades do mundo então conhecido para anunciar a Ressurreição e a Boa Nova da Salvação. Um dia, chegou a Atenas. Ali teve ocasião de no Areópago conversar com os filósofos e simultaneamente referirse aos deuses do Pártenon. Teve, então, oportunidade de dizer: “Eu venho falar-lhes do Deus desconhecido”, aliás, presente numa coluna do Pártenon onde não se encontrava qualquer estátua dos deuses gregos. Paulo falou de Jesus Cristo que, tendo morrido na cruz, ressuscitou dos mortos. É certo que os filósofos adiaram a conversa sobre a ressurreição, mas com Dionísio Areopagita ficou presente uma comunidade cristã também naquela grande metrópole. Hoje, nas comunidades cristãs, também pode haver um deus desconhecido, o Espírito Santo. A maioria dos cristãos reconhece Deus Pai, cheio de amor e misericórdia para todos; também se relaciona com Jesus Cristo, Filho de Deus feito homem; mas o Deus desconhecido é mesmo o Espírito Santo, que nem todos sentem presente nas suas vidas. Mas afinal quem é o Espírito Santo? Uma definição muito simples é, no coração da Trindade, é a constante relação de amor entre o Pai e o Filho. Também é a partir do Espírito Santo que se fazem novas todas as coisas e que Jesus se revela a todos os homens. É importante por isso conhecer e amar o Espírito Santo e viver sempre segundo o Espírito.
.O Espírito Santo foi prometido aos Apóstolos quando Jesus lhes disse que lhes iria enviar o Paráclito que lhes ensinaria todas as coisas e os ajudaria a lembrar tudo o que eventualmente tivessem esquecido. O Espírito Santo foi dado aos Apóstolos na tarde do dia da Ressurreição, quando Jesus, entrando no Cenáculo, lhes disse expressamente que lhes dava o Espírito, e que a partir do Espírito Santo tinham o poder de perdoar os pecados.
.O Espírito Santo foi depois manifestado no dia de Pentecostes, quando línguas de fogo pousaram sobre os Apóstolos naquela manhã de Jerusalém. 3000 judeus curiosos foram ao encontro de Pedro que, na força do Espírito, lhes anunciou Cristo Ressuscitado. Converteram-se e perguntaram de imediato o que é que teriam de fazer como cristãos.
.O Espírito Santo acompanhou toda a aventura da evangelização realizada por Pedro, Paulo e os outros discípulos em todo o mundo conhecido. Movidos pelo Espírito, anunciavam a Redenção através de Jesus Cristo vencedor de todas as mortes.
.Finalmente, o Espírito Santo acompanha a vida da Igreja através dos séculos. Só na força do Espírito a Igreja Santa tem podido ultrapassar as inúmeras dificuldades que vem enfrentando ao longo dos tempos.
O Espírito Santo continua a ser o Deus desconhecido para inúmeros cristãos. É certo que há hoje na Igreja grupos carismáticos que convidam a um relacionamento profundo com o Deus Espírito Santo. Mas, mesmo neste caso, fica-se um pouco na superficialidade, sem se ir à profundidade teológica que leva o cristão a viver do Espírito. Com razão Paulo pôde dizer: “Não sabeis que sois templo do Espírito Santo e que o Espírito Santo habita em vós?” (1Cor 6, 19).
2. O Espírito Santo é oferecido à Igreja e aos cristãos com os seus sete dons. Por muito que se quisesse acompanhar a acção de Deus no mundo, tal não seria possível sem o apoio do Espírito Santo. Conhecer o mistério de Deus, compreender a aventura da Redenção realizada por Jesus, viver a experiência da Igreja como Povo de Deus, nada disto é possível sem a intervenção directa do Espírito Santo. A inteligência humana não tem capacidade para entender o mistério de Deus. A vontade, por muito generosa que seja, tem sempre dificuldade para decidir segundo os critérios de Deus. Também, a sensibilidade no amor é imperfeita se não é o próprio Deus, através do Espírito Santo que multiplica o amor em todas as situações. O Senhor Jesus enviou o Espírito Santo para enriquecer a inteligência humana, para valorizar a vontade muitas vezes enfraquecida, para provocar o amor, nem sempre fácil.
.Os dons para o apoio à inteligência são três: a sabedoria permite o acesso à realidade de Deus; o entendimento ajuda a compreender tudo o que de Deus vem para o ser humano, para que este possa realizar na sua vida o projecto que Deus tem para ele; a ciência permite ver as coisas humanas com os olhos de Deus, tornando tudo diferente e melhor.
.Os dons para enriquecer a vontade são dois: o conselho, para o discernimento indispensável às grandes opções da vida, segundo os critérios de Deus; a fortaleza, para se ter a coragem de decidir não segundo os próprios gostos, mas segundo o que Deus tem direito a pedir.
.Os dons para valorizar o amor são dois: a piedade provoca uma intimidade de relação profunda com o Deus em que se acredita e que se ama; o temor de Deus não significa qualquer medo, mas é sinal do quanto se sofre pelo facto de não se amar a Deus na medida em que Ele tem direito.
Pelos dons do Espírito Santo o ser humano transfigura-se, entra no mistério de Deus, aceita a profunda comunhão com o Deus que quis fazer-se homem e, finalmente, abandona-se na acção que o Espírito Santo quer realizar em cada um, para o bem de todos. Não é possível ser cristão sem esta iluminação constante do Espírito Santo em todas as faculdades humanas. Daí a importância de O conhecer e se deixar influenciar por Ele para que o projecto de vida cristã se opere em cada um em plenitude.
3. Quem vive segundo o Espírito, frutifica segundo o mesmo Espírito. É S. Paulo aos Gálatas (Gl 5, 22-24) que ao falar da liberdade contrapõe à liberdade dos instintos a liberdade segundo o Espírito, a liberdade dos filhos de Deus. Se os instintos provocam crises na relação com Deus e na relação com os irmãos, a liberdade segundo o Espírito frutifica em boas obras que conduzem à bem-aventurança. Perguntar-se-á quais são os frutos do Espírito. Paulo responde a três dimensões: com as atitudes fundamentais, com o compromisso de generosidade e a responsabilidade comunitária.
.As atitudes fundamentais para o cristão são certamente o amor, a alegria e a paz. Estas características dão ao cristão, na força do Espírito, uma enorme capacidade para ser feliz. Pelo amor fazem-se felizes os outros, pela alegria pascal superam-se os sofrimentos, pela paz vive-se na harmonia plena em comunidade.
.O compromisso de generosidade perante a força do Espírito são sem dúvida: paciência, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão. Frutos do Espírito essenciais à boa relação entre todos mas que se fundamentam na opção cristã de cada um.
.A responsabilidade comunitária passa pelo autodomínio do cristão, que não será nunca possível sem o recurso à força do Espírito Santo.
Sem a acção do Espírito no coração de cada um e na vida da Igreja nunca seria possível contrariar o mundo difícil em que o egoísmo se sobrepõe à solidariedade, em que a violência é preferida à dinâmica do amor, em que a arrogância impede a construção da paz. O Espírito Santo está mesmo presente na vida do cristão, na comunhão da Igreja e no desafio à humanidade.
4. Neste Domingo do Pentecostes muitos cristãos da comunidade Paroquial do Campo Grande vão receber o sacramento do Crisma. Ungidos com o óleo santo, são enviados a anunciar o Evangelho a toda a criatura. A partir de agora assumem o testemunho cristão em todas as situações, mas assumem também, pela acção evangelizadora, servir a Igreja e o mundo. Confirmados pelo sacramento, os cristãos tornam-se militantes no anúncio do Evangelho: dar a Boa Nova aos pobres, a libertação aos oprimidos, a alegria aos que sofrem e instaurar o ano da reconciliação e da paz (Lc 4, 18). A vida dos confirmados está centrada no testemunho do amor e na proclamação de Jesus Cristo Ressuscitado. São já centenas de cristãos que têm sido confirmados nesta Paróquia do Campo Grande. A responsabilidade missionária destes cristãos exige-lhes proclamar a Palavra, porque é “da Palavra que nasce a fé”, como nos diz o Sínodo Diocesano.
P. Vítor Feytor Pinto