- A liturgia, no dizer do Concílio Vaticano II, é o “exercício da função sacerdotal de Cristo” (SC 7). Participando nos actos litúrgicos, sacerdotes e leigos vivem o mistério de Cristo sacerdote: os Bispos, presbíteros e diáconos participam no sacerdócio ministerial e os leigos participam no sacerdócio comum dos fiéis. Celebrar a liturgia é celebrar o sacerdócio de Jesus, sumo e eterno sacerdote. A liturgia não é apenas manifestação de ritos, mais ou menos significativos; não é uma série de orações proclamadas ou cantadas; não, como diz o Papa Francisco, um espectáculo que tem como cenário igrejas cheias de arte com actores suficientemente preparados, coros polifónicos acompanhados por órgãos renascentistas e, até, roupas tiradas dos armários, para dar mais beleza à celebração.
. A liturgia é mesmo a presença do sacerdócio de Cristo na vida das comunidades cristãs. Tudo é Cristo que se recorda em momentos chave da sua vida, é Cristo que pela sua presença se comunica a todos, é Cristo sacramento, fundamento da fé, e é Cristo revelado aos crentes que se comprometem, sobretudo pelo amor, a misericórdia, o perdão, a comunhão até à unidade.
. A liturgia, na definição conciliar, tem três tempos: o ciclo do Natal para celebrar o Nascimento de Jesus; o ciclo da Páscoa para celebrar a Sua morte e ressurreição; e, depois, o tempo comum. A vida litúrgica desenvolve-se ao longo de três anos, com a referência aos três evangelistas sinópticos. A liturgia garante assim um conhecimento sempre maior da Pessoa de Jesus Cristo, fundamento da fé cristã.
. Finalmente, a liturgia permite a organização de todos os fiéis na comunidade. Na definição conciliar da Eucaristia (cf. SC 47), indica-se os grandes valores de qualquer celebração litúrgica: sinal de unidade, vínculo de amor, expressão da piedade e recordação sempre da morte e ressurreição de Cristo.
É por tudo isto que o Papa Francisco teve a preocupação de falar da liturgia como referência fundamental na relação dos cristãos com a Pessoa de Jesus. Francisco deseja profundamente que o espírito litúrgico definido no Vaticano II se concretize na prática das comunidades. Por isso ele repetiu já várias vezes que a renovação litúrgica é irreversível.
- O Tempo Comum é um tempo que decorre em duas etapas: entre a Epifania e a Quarta-feira de Cinzas e, depois do Pentecostes, até ao primeiro domingo do Advento. No seu conjunto, o tempo comum envolve 34 semanas, ao longo do ano. As primeiras 10 existem entre o ciclo do Natal e o ciclo Pascal. As outras 24, anualmente, correm no longo espaço que tem lugar a seguir ao domingo de Pentecostes até ao fim do ano litúrgico. É um tempo muito importante na liturgia porque permite uma reflexão e um acompanhamento que são fundamentais à vida cristã.
. A celebração da Palavra, neste tempo, está centrada no evangelista do ano. Em 2018 o evangelista é S. Marcos. Ele vai acompanhar a vida do cristão ao longo deste tempo de 34 semanas.
. De alguma maneira, este Tempo Comum permite a “Lectio Continuata”, uma leitura continuada do Evangelho, acompanhando a sequência dos domingos, com as normais alegrias e esperanças do cristão na sua vida quotidiana.
. O Tempo Comum permite uma certa catequese sistemática que, na homilia dominical, o presidente da Eucaristia vai trabalhando, para ajudar os fiéis a crescerem sempre mais na fé e na caridade.
. Os textos litúrgicos do Tempo Comum, para além dos Evangelhos, permitem conhecer a sequência da Palavra de Deus nas mensagens dos profetas e dos livros sapienciais e, depois, acolher a riqueza das Cartas dos Apóstolos, com exigências extraordinárias para a vida cristã, um viver que conduz à felicidade.
O Tempo Comum não é um tempo litúrgico secundário ou de menos importância. Eventualmente pode tornar-se um tempo magnífico para uma catequese continuada, verdadeira iniciação ou reiniciação à vida cristã.
- O evangelista do ano, como acima referimos é S. Marcos. É o ano B na liturgia. Não se sabe ao certo quem é Marcos, consideramos que poderá ter sido um dos 72 discípulos referidos no capítulo 10 de S. Lucas. Sabe-se que cruzou a sua vida com Pedro, várias vezes, pelo que foi possível escrever, numa linguagem muito simples, a catequese de Pedro. Poderá também ser João Marcos, filho de Maria, em cuja casa os cristãos se reuniam para orar. Terá acompanhado Paulo em algumas das suas viagens, mas a tradição liga-o muitas vezes a Pedro que ele seguiu até Roma.
. O Evangelho de Marcos apresenta uma cristologia muito simples, afirmando pela boca de Pedro que Jesus é o Messias, o Filho de Deus. Conta o ministério de Jesus na Galileia, as viagens de Jesus por Tiro, Sidónia e Decápole, e, no final, relata o ministério de Jesus em Jerusalém, seguido da condenação e morte na cruz.
. Com Marcos, a liturgia escolhe os momentos mais significativos da vida de Jesus, com um esquema que permite dizer que se trata de uma catequese continuada, a catequese de Pedro.
. Com uma longa sequência de domingos torna-se mais fácil organizar a catequese, oferecida como iniciação ou reiniciação cristã àqueles que participam habitualmente nas Eucaristias dominicais. De facto, as homilias não são para celebrar os domingos, são a experiência da presença da Pessoa de Jesus, na vida do sacerdote e na via dos fiéis que estão presentes na Eucaristia.
Nestas várias semanas do Tempo Comum valerá a pena, reflectir sobre o Evangelho, traduzi-lo na vida de cada um e depois fazer dele a fonte de oração que se renova ao longo dos dias. Assim será mais fácil compreender a mensagem dos textos, sempre com orientações muito fortes para a vida cristã no quotidiano.
- Neste segundo domingo do Tempo Comum iniciamos um caminho de aprofundamento da fé e de compromisso cristão na relação com Deus e na caridade para com os outros. É o Tempo Comum que é verdadeiro tempo novo para ultrapassar as rotinas ou, até, para vencer as dificuldades, sempre iluminados pela Pessoa de Jesus Cristo bem presente na Boa Nova do Evangelho. Vamos dar ao Tempo Comum a extraordinária importância que ele tem não só no conhecimento melhor da Pessoa de Jesus, como, sobretudo, no “respirar” uma espiritualidade que pode renovar-nos completamente.
Pe. Vítor Feytor Pinto