Domingo da Palavra de Deus, na recepção do Sínodo Diocesano de Lisboa 

 

“No Princípio, antes de tudo, uma Palavra foi pronunciada. Tu, meu Deus, disseste: Faça-se! E em obediência a uma simples Palavra tua, criaram-se luz, trevas, céu, estrelas, água, terra, plantas e animais. Disseste ainda uma outra vez a mesma Palavra, pensada com maior Amor, e criaste a humanidade: homem e mulher os criaste, à tua imagem e à tua semelhança, Teu Espírito insuflado em suas narinas, seu corpo repleto da vida que lhes deste.

Foi em resposta a uma Palavra Tua que Abraão deixou a terra, os parentes e foi para um lugar novo, terra de promessas, de bênção, de vida enriquecida com a doçura do leite e do mel. Essa Palavra foi a nascente de um povo novo, rebento novo, de uma raiz aprofundada em ti.

A Tua Palavra foi a resposta ao clamor do povo escravo no Egipto, povo sugjugado, povo sofredor, povo destituído de dignidade, povo escravo de uma vontade alheia a Ti. E tu chamaste Moisés, e por Moisés chamaste o povo de novo a Ti, ao teu cuidado, à Aliança, ao caminho do teu Amor.

A Tua Palavra ungiu reis e profetas, derrotou exércitos e opressores, ensinou e corrigiu, encorajou e dirigiu o povo ao longo de muitos séculos, por desertos e caminhos nem sempre fáceis, por exílios e tiranias de estrangeiros. A Tua Palavra acompanhou, a Tua Palavra foi presença, a Tua Palavra reavivou a memória enfraquecida. Pela Tua Palavra Ezequiel profetizou aos ossos ressequidos e eles reganharam vida. Ao escutar a Tua Palavra, após muitos anos de exílio, o povo molhou o chão de Jerusalém com as suas lágrimas de alegria, espanto e gratidão.

A uma Palavra tua, o ventre de Maria encheu-se de graça e a Palavra fez-se carne. Nasceu Jesus-Palavra: humanidade e divindade unidas numa só pessoa.

A Tua Palavra ressoou em Jesus Cristo, em todos os momentos em que ensinou, curou, perdoou.

À Tua Palavra, foram chamados Apóstolos e discípulos! à Tua Palavra converteram-se publicanos como Zaqueu e Mateus e pecadores, como a mulher adúltera! À Tua Palavra ficaram curados cegos, paralíticos e leprosos…

Para escutar a Tua Palavra, Maria esqueceu a irmã Marta e o trabalho, e ficou silenciosa e quieta sentada a teus pés; mais tarde, a tua Palavra, faria sair vivo do túmulo, o seu irmão Lázaro, morto há já três dias… A Tua Palavra vence os impossíveis.

Naquela noite escura da Paixão, a Palavra foi presa, julgada, flagelada e coroada de espinhos. E nós vimos a Palavra ser empurrada monte acima, carregando a cruz até ao calvário. E crucificaram a Palavra. A morte foi a mordaça que tentaram impor-te! Mas Tu nunca te deste por vencido, tu que és Jesus-Palavra, depois do silêncio cortante do túmulo, esse silêncio ensurdecedor do sem-sentido, gritaste na eternidade a Palavra da Ressurreição. E a Palavra sufocada, nunca mais pôde ser silenciada.

Tu, a Palavra, continuaste a falar nas nossas vidas. Estás presente na Sagrada Escritura, estás na Palavra proclamada na Liturgia, estás no ensinamento daqueles que sucederam aos Apóstolos, estás no livro da Criação que escreves para nós e estás presente em nós, na nossa vida, na vida daqueles que, escutando e vivendo a Palavra, se tornam Palavra no meio do mundo. Palavra esperança, Palavra justiça, Palavra paz, Palavra amor… Vivendo contigo e por ti, somos Palavra afirmativa, Palavra incontida, como um grito no meio do mundo.

Hoje te pedimos, Jesus-Palavra: faz que sejamos aqueles discípulos que te dizem com convicção: “a quem iremos, Senhor? Só tu tens Palavras de vida eterna” (Jo 6, 68)! Faz que tenhamos o desejo de ler, escutar e aprofundar a tua Palavra… Faz que tenhamos a fortaleza para lhe obedecer… faz com que tenhamos a coragem para a anunciar.

 

No meio das palavras-ruído que nos ensurdecem, que nos desorientam, que nos afastam de ti, é preciso que a tua Palavra brilhe como luz dos nossos caminhos, como farol para os nossos passos.

À Tua Palavra, Senhor – só à Tua Palavra – lançaremos nossas redes! (cf. Lc 5,5)

 

20 outubro 2017