UMA OPÇÃO RADICAL – Quem percorre as páginas do Evangelho, encontra nelas inúmeras atitudes de radicalidade. S. Lucas chega a pôr na boca de Cristo expressões como estas: “o Filho do homem não tem uma pedra onde deitar a cabeça”, ou “deixa que os mortos se enterrem uns aos outros”, ou ainda “quem diz que quer ser meu discípulo e olha para trás, não é digno de mim” (cf. Lc 9, 57-62). Com estas palavras sente-se a exigência de Cristo para com aqueles que querem segui-l’O. O Evangelho de hoje confirma esta exigência. Jesus pede uma liberdade incondicional perante as pessoas, as coisas e as situações. Por isso, neste Evangelho, convida-se quem O segue a deixar os irmãos, as irmãs, o pai, a mãe, os filhos e a própria mulher. Esta descrição da liberdade tem pormenores curiosíssimos. É mais fácil deixar os homens (irmãos, filhos e pai), do que deixar as mulheres (irmãs e mãe) uma vez que o universo da afectividade torna mais difícil uma libertação radical. É mais fácil deixar a família mais antiga, do que aquela que acaba de se constituir, por isso a mulher aparece em último lugar. O curioso, ainda, é que no campo da liberdade se considera como o mais difícil deixar a casa e os campos. Os bens constituem a maior prisão dos humanos. Assim se desenha a perspectiva da radicalidade. Uma vez que se aceite a Pessoa de Jesus sem condições, então, é fácil levar a cruz.

O Evangelho conta ainda a parábola da Torre que se quer construir e da batalha que se quer travar. Com realismo, refere-se que é necessário preparar qualquer destas acções. Também aqui, as opções têm que ser fundamentadas. Quando um cristão se entrega à verdade do Evangelho, tem de se preparar previamente para poder ser fiel até ao fim. A opção radical por Cristo é o critério de toda a sua vida.

A liturgia deste domingo faz referência à radicalidade proposta por Paulo a Filemon. O escravo Onésimo tinha defraudado o seu senhor. Arrependido, pede a intercessão de Paulo que está prisioneiro. A carta a Filemon é uma das páginas mais belas do Evangelho. Numa proposta radical, Paulo pede a Filemon que receba Onésimo como irmão e o acolha como o faria a ele próprio. Nesta proposta de Paulo misturam-se a justiça, com a caridade e com o perdão, virtudes essenciais ao ser cristão.

Dificilmente se poderão percorrer estes caminhos propostos pela liturgia de hoje sem nos deixarmos possuir pela sabedoria de Deus. Toda a relação humana, marcada pela presença de Deus, se transforma numa relação de amor radical.

Monsenhor Vitor Feytor Pinto

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«Quem não renunciar a todos os seus bens
não pode ser meu discípulo»

(Lc 14, 33)

I LEITURA – Sab 9, 13-19 (gr. 13-18b)

A respeito de Deus e das coisas de Deus, o nosso pensamento tem de proceder com prudência e humildade. 

Leitura do Livro da Sabedoria
Qual o homem que pode conhecer os desígnios de Deus? Quem pode sondar as intenções do Senhor? Os pensamentos dos mortais são mesquinhos e inseguras as nossas reflexões, porque o corpo corruptível deprime a alma e a morada terrestre oprime o espírito que pensa. Mal podemos compreender o que está sobre a terra e com dificuldade encontramos o que temos ao alcance da mão. Quem poderá então descobrir o que há nos céus? Quem poderá conhecer, Senhor, os vossos desígnios, se Vós não lhe dais a sabedoria e não lhe enviais o vosso espírito santo? Deste modo foi corrigido o procedimento dos que estão na terra, os homens aprenderam as coisas que Vos agradam e pela sabedoria foram salvos.
Palavra do Senhor.

SALMO RESPONSORIAL – Salmo 89 (90), 3-6.12-14.17 (R. 1)

Refrão: Senhor, tendes sido o nosso refúgio
através das gerações. Repete-se

Vós reduzis o homem ao pó da terra
e dizeis: «Voltai, filhos de Adão».
Mil anos a vossos olhos
são como o dia de ontem que passou
e como uma vigília da noite. Refrão

Vós os arrebatais como um sonho,
como a erva que de manhã reverdece;
de manhã floresce e viceja,
à tarde ela murcha e seca. Refrão

Ensinai-nos a contar os nossos dias,
para chegarmos à sabedoria do coração.
Voltai, Senhor! Até quando…
Tende piedade dos vossos servos. Refrão

Saciai-nos desde a manhã com a vossa bondade,
para nos alegrarmos e exultarmos todos os dias.
Desça sobre nós a graça do Senhor nosso Deus.
Confirmai, Senhor, a obra das nossas mãos. Refrão

II LEITURA – Flm 9b-10.12-17

S. Paulo escreve a Filémon, apelando em nome da caridade que aceite de volta o seu escravo Onésimo que havia fugido com uma avultada quantia. Nessa carta pede-lhe não só que perdoe, mas receba o antigo escravo “como irmão muito querido”.

Leitura Epístola do Apóstolo S. Paulo a Filémon
Carissimo: Eu, Paulo, prisioneiro por amor de Cristo Jesus, rogo-te por este meu filho, Onésimo, que eu gerei na prisão. Mando-o de volta para ti, como se fosse o meu próprio coração. Quisera conservá-lo junto de mim, para que me servisse, em teu lugar, enquanto estou preso por causa do Evangelho. Mas, sem o teu consentimento, nada quis fazer, para que a tua boa acção não parecesse forçada, mas feita de livre vontade. Talvez ele se tenha afastado de ti durante algum tempo, a fim de o recuperares para sempre, não já como escravo, mas muito melhor do que escravo: como irmão muito querido. É isto que ele é para mim e muito mais para ti, não só pela natureza, mas também aos olhos do Senhor. Se me consideras teu amigo, recebe-o como a mim próprio.
Palavra do Senhor.

ALELUIA – Salmo 118 (119), 135

Refrão: Aleluia. Repete-se

Fazei brilhar sobre mim, Senhor,
a luz do vosso rosto
e ensinai-me os vossos mandamentos. Refrão

EVANGELHO – Lc 14, 25-33

O cristão deve renovar constantemente o seu compromisso em Cristo, que não será de verdade se não houver uma renúncia ao amor próprio, ao egoísmo, ao dinheiro…

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
Naquele tempo, seguia Jesus uma grande multidão. Jesus voltou-Se e disse-lhes: «Se alguém vem ter comigo, e não Me preferir ao pai, à mãe, à esposa, aos filhos, aos irmãos, às irmãs e até à própria vida, não pode ser meu discípulo. Quem não toma a sua cruz para Me seguir, não pode ser meu discípulo. Quem de vós, desejando construir uma torre, não se senta primeiro a calcular a despesa, para ver se tem com que terminá-la? Não suceda que, depois de assentar os alicerces, se mostre incapaz de a concluir e todos os que olharem comecem a fazer troça, dizendo: ‘Esse homem começou a edificar, mas não foi capaz de concluir’. E qual é o rei que parte para a guerra contra outro rei e não se senta primeiro a considerar se é capaz de se opor, com dez mil soldados, àquele que vem contra ele com vinte mil? Aliás, enquanto o outro ainda está longe, manda-lhe uma delegação a pedir as condições de paz. Assim, quem de entre vós não renunciar a todos os seus bens, não pode ser meu discípulo».
Palavra da salvação.