PERDOAR SEMPRE – As dificuldades nas relações humanas são uma constante no mundo actual. Atingem hoje, uma dimensão que muitas vezes leva à rotura. Na família, o menor atrito faz surgir ameaças de divórcio. No trabalho a procura de lugares mais vantajosos levam muitas vezes ao corte de relações. Na política os interesses dos grupos conduzem à total incapacidade de procurar em conjunto o bem comum. Até na vida social, uma palavra infeliz provoca uma ofensa que amargura as pessoas para o resto da vida. São muito difíceis as relações humanas. Já era assim no tempo de Jesus e por isso Pedro perguntou quantas vezes se deveria perdoar. Ele tinha a noção de que perdoar três vezes já era “um preço alto”. Então, por conhecer as “medidas” de Jesus, perguntou se se deveria perdoar sete vezes. Na linguagem de hoje quem perdoa uma vez é bom, quem perdoa duas vezes é santo, mas quem perdoa três vezes à mesma pessoa, esse, então, “é parvo”. A resposta de Jesus à pergunta de Pedro, rompe todos os critérios do perdão. O cristão não perdoa três vezes, nem sete vezes, deve perdoar setenta vezes sete vezes, o que quer dizer, sempre. É esta a “medida” de Cristo.
Numa parábola cheia de sentido Jesus descreve a procura do perdão por conveniência. O servo infiel pede perdão ao senhor, mas não perdoa ao companheiro, quer compreensão para a sua dívida maior, mas não tolera ao companheiro uma dívida quase ridícula. É frequente nas relações humanas haver duas medidas, conforme os interesses que estão em causa. Isto acontece porque não há valores de referência que pautem as atitudes em qualquer situação. Por isso se compreende a expressão “a medida com que queres ser medido é a medida que deves ter na relação com os outros”. Na perspectiva de Jesus Cristo que repetiu muitas vezes ser o amor o seu mandamento é inevitável que o perdão se deva dar sempre. É a radicalidade do amor como mandamento novo.
A preocupação pelo perdão é antiga. O Livro de Ben-Sirá refere-o expressamente quando diz que é necessário deixar a ira e o rancor, nunca ter vingança e ser capaz de perdoar as ofensas. Ben-Sirá já superava “a Lei de Talião”, amar o amigo e odiar o inimigo. Jesus, porém, afirma claramente que é necessário perdoar sempre quaisquer que sejam as consequências. Aliás, para perdoar na radicalidade, Jesus daria a vida por todos os homens, no sacrifício do Calvário. Da cruz não teve outras palavras senão as do perdão sem condições.
Paulo completará esta maneira de ver as relações humanas quando afirma, na Carta aos Romanos: “ninguém vive para si mesmo, vivemos para o Senhor e morremos para o Senhor” (Rm 14, 7). Perdoar sempre é mesmo dar a vida.
Monsenhor Vítor Feytor Pinto
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LITURGIA DA PALAVRA:
«NAO TE DIGO QUE PERDOES ATÉ SETE VEZES,
MAS ATÉ SETENTA VEZES SETE»
(Mt 18, 22)
I LEITURA – Sir 27, 33 – 28, 9
«O rancor e a ira são coisas detestáveis. Quem se vinga sofrerá a vingança do Senhor»
Leitura do Livro de Ben-Sirá
O rancor e a ira são coisas detestáveis, e o pecador é mestre nelas. Quem se vinga sofrerá a vingança do Senhor, que pedirá minuciosa conta de seus pecados. Perdoa a ofensa do teu próximo e, quando o pedires, as tuas ofensas serão perdoadas. Um homem guarda rancor contra outro e pede a Deus que o cure? Não tem compaixão do seu semelhante e pede perdão para os seus próprios pecados? Se ele, que é um ser de carne, guarda rancor, quem lhe alcançará o perdão das suas faltas? Lembra-te do teu fim e deixa de ter ódio; pensa na corrupção e na morte, e guarda os mandamentos. Recorda os mandamentos e não tenhas rancor ao próximo; pensa na aliança do Altíssimo e não repares nas ofensas que te fazem.
Palavra do Senhor.
SALMO – 102 (103), 1-2.3-4.9-10.11-12
Refrão: O Senhor é clemente e compassivo,
paciente e cheio de bondade. Repete-se
Bendiz, ó minha alma, o Senhor
e todo o meu ser bendiga o seu nome santo.
Bendiz, ó minha alma, o Senhor
e não esqueças nenhum dos seus benefícios. Refrão
Ele perdoa todos os teus pecados
e cura as tuas enfermidades.
Salva da morte a tua vida
e coroa-te de graça e misericórdia. Refrão
Não está sempre a repreender,
nem guarda ressentimento.
Não nos tratou segundo os nossos pecados,
nem nos castigou segundo as nossas culpas. Refrão
Como a distância da terra aos céus,
assim é grande a sua misericórdia para os que O temem.
Como o Oriente dista do Ocidente,
assim Ele afasta de nós os nossos pecados. Refrão
II LEITURA – Rom 14, 7-9
«Nenhum de nós vive para si mesmo e nenhum de nós morre para si mesmo»
Leitura da Epístola do Apóstolo São Paulo aos Romanos
Irmãos: Nenhum de nós vive para si mesmo e nenhum de nós morre para si mesmo. Se vivemos, vivemos para o Senhor, e se morremos, morremos para o Senhor. Portanto, quer vivamos quer morramos, pertencemos ao Senhor. Na verdade, Cristo morreu e ressuscitou para ser o Senhor dos vivos e dos mortos.
Palavra do Senhor.
ALELUIA – Jo 13, 34
Refrão: Aleluia. Repete-se
Dou-vos um mandamento novo, diz o Senhor:
amai-vos uns aos outros como Eu vos amei. Refrão
EVANGELHO – Mt 18, 21-35
O perdão sem limites.
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
Naquele tempo, Pedro aproximou-se de Jesus e perguntou-Lhe: «Se meu irmão me ofender, quantas vezes deverei perdoar-lhe? Até sete vezes?». Jesus respondeu: «Não te digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete. Na verdade, o reino de Deus pode comparar-se a um rei que quis ajustar contas com os seus servos. Logo de começo, apresentaram-lhe um homem que devia dez mil talentos. Não tendo com que pagar, o senhor mandou que fosse vendido, com a mulher, os filhos e tudo quanto possuía, para assim pagar a dívida. Então o servo prostrou-se a seus pés, dizendo: ‘Senhor, concede-me um prazo e tudo te pagarei’. Cheio de compaixão, o senhor daquele servo deu-lhe a liberdade e perdoou-lhe a dívida. Ao sair, o servo encontrou um dos seus companheiros que lhe devia cem denários. Segurando-o, começou a apertar-lhe o pescoço, dizendo: ‘Paga o que me deves’. Então o companheiro caiu a seus pés e suplicou-lhe, dizendo: ‘Concede-me um prazo e pagar-te-ei’. Ele, porém, não consentiu e mandou-o prender, até que pagasse tudo quanto devia. Testemunhas desta cena, os seus companheiros ficaram muito tristes e foram contar ao senhor tudo o que havia sucedido. Então, o senhor mandou-o chamar e disse: ‘Servo mau, perdoei-te tudo o que me devias, porque mo pediste. Não devias, também tu, compadecer-te do teu companheiro, como eu tive compaixão de ti?’. E o senhor, indignado, entregou-o aos verdugos, até que pagasse tudo o que lhe devia. Assim procederá convosco meu Pai celeste, se cada um de vós não perdoar a seu irmão de todo o coração».
Palavra da salvação.