“… E DEUS NÃO HAVIA DE FAZER JUSTIÇA AOS SEUS ELEITOS; QUE POR ELE CLAMAM DIA E NOITE (…)?
(Lc 18, 7)
I LEITURA – Ex 17, 8-13
O poder da fé e da oração, apresentado numa narrativa tradicional
Leitura do Livro do Êxodo
Naqueles dias, Amalec veio a Refidim atacar Israel. Moisés disse a Josué: «Escolhe alguns homens e amanhã sai a combater Amalec. Eu irei colocar-me no cimo da colina, com a vara de Deus na mão». Josué fez o que Moisés lhe ordenara e atacou Amalec, enquanto Moisés, Aarão e Hur subiram ao cimo da colina. Quando Moisés tinha as mãos levantadas, Israel ganhava vantagem; mas quando as deixava cair, tinha vantagem Amalec. Como as mãos de Moisés se iam tornando pesadas, trouxeram uma pedra e colocaram-na por debaixo para que ele se sentasse, enquanto Aarão e Hur, um de cada lado, lhe seguravam as mãos. Assim se mantiveram firmes as suas mãos até ao pôr do sol e Josué desbaratou Amalec e o seu povo ao fio da espada.
SALMO -120 (121), 1-8 (R. cf. 2)
Refrão: O nosso auxílio vem do Senhor, que fez o céu e a terra
Levanto os meus olhos para os montes:
donde me virá o auxílio?
O meu auxílio vem do Senhor,
que fez o céu e a terra. Refrão
Não permitirá que vacilem os teus passos,
não dormirá Aquele que te guarda.
Não há-de dormir nem adormecer
Aquele que guarda Israel. Refrão
O Senhor é quem te guarda,
o Senhor está a teu lado, Ele é o teu abrigo.
O sol não te fará mal durante o dia,
nem a lua durante a noite. Refrão
O Senhor te defende de todo o mal,
o Senhor vela pela tua vida.
Ele te protege quando vais e quando vens,
agora e para sempre. Refrão
II LEITURA – 2 Tim 3, 14 – 4, 1-2
«Manifestem-se firmes na fé, apoia-te na Escritura, proclama a palavra de Deus. A propósito e a despropósito. com toda a paciência e doutrina».
Leitura da Segunda Epístola do apóstolo São Paulo a Timóteo
Caríssimo: Permanece firme no que aprendeste e aceitaste como certo, sabendo de quem o aprendeste. Desde a infância conheces as Sagradas Escrituras; elas podem dar-te a sabedoria que leva à salvação, pela fé em Cristo Jesus. Toda a Escritura, inspirada por Deus, é útil para ensinar, persuadir, corrigir e formar segundo a justiça. Assim o homem de Deus será perfeito, bem preparado para todas as boas obras. Conjuro-te diante de Deus e de Jesus Cristo, que há-de julgar os vivos e os mortos, pela sua manifestação e pelo seu reino: Proclama a palavra, insiste a propósito e fora de propósito, argumenta, ameaça e exorta, com toda a paciência e doutrina.
EVANGELHO – Lc 18, 1-8
O juiz desonesto fez a justiça à viúva porque ela o importunava. Deus é por nós mas quer que insistamos.
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
Naquele tempo, Jesus disse aos seus discípulos uma parábola sobre a necessidade de orar sempre sem desanimar: «Em certa cidade vivia um juiz que não temia a Deus nem respeitava os homens. Havia naquela cidade uma viúva que vinha ter com ele e lhe dizia: ‘Faz-me justiça contra o meu adversário’. Durante muito tempo ele não quis atendê-la. Mas depois disse consigo: ‘É certo que eu não temo a Deus nem respeito os homens; mas, porque esta viúva me importuna, vou fazer-lhe justiça, para que não venha incomodar-me indefinidamente’». E o Senhor acrescentou: «Escutai o que diz o juiz iníquo!… E Deus não havia de fazer justiça aos seus eleitos, que por Ele clamam dia e noite, e iria fazê-los esperar muito tempo? Eu vos digo que lhes fará justiça bem depressa. Mas quando voltar o Filho do homem, encontrará fé sobre a terra?».
XXIX DOMINGO DO TEMPO COMUM (Comentários do Pe. João Resina in a Palavra no tempo II)
Jesus insistiu na necessidade de orar sempre, sem desanimar. A propósito, contou uma parábola: a do juiz iníquo, que durante muito tempo se recusou a fazer justiça a uma viúva pobre, mas finalmente a atendeu, só para se ver livre da sua importunação. Habituados às parábolas do Senhor, parece-nos encontrar nesta um absurdo: então não está a comparar Deus a um juiz injusto?
Recordo que, na opinião dos exegetas, as parábolas de Jesus não são para ser traduzidas elemento a elemento. São histórias em que existe um aspecto gritante – e é sobre esse aspecto gritante que a doutrina se apoia.
Nesta parábola há um aspecto gritante: a teimosia da viúva. Encontrou uma barreira, mas não desistiu. E alcançou o seu desejo. Jesus diz-nos que continuemos a rezar, mesmo que nos sintamos confrontados com a barreira do silêncio. Cedo ou tarde – não é de nossa conta – Deus nos atenderá.
Há um outro aspecto gritante na parábola: a barreira que a viúva encontra é infelizmente comum: a maldade daquele homem, exemplo do mal no mundo. E como se articula isto com Deus? Não sei responder à pergunta, sei apenas que o mal do mundo é um companheiro constante da vida cristã (era já companheiro constante da vida humana, e a vida cristã não o ignora, antes o sublinha).
Rezar é difícil: porque não temos tempo para nada, e também não para rezar; porque Deus não se vê nem se toca; porque o mal do mundo (inserido dia – a – dia nas nossas vidas pelos jornais e pela TV) nos indispõe contra Deus.
Jesus nunca procurou esconder a existência do mal, nem minimizar-lhe a importância. Não consta que tenha falado do pecado original, mas disse sempre que o mundo está dominado pelo mal. Usou mesmo, para falar do mal, as expressões: “o inimigo”, “o maligno”, “Satanás”. Quer estas expressões signifiquem que realmente existe o Demónio, quer sejam maneira de sublinhar a gravidade do mal no mundo, Jesus interpretou a sua caminhada na Terra como uma luta contra esse adversário supremo, e mobilizou os discípulos para a mesma luta. “E não nos deixeis cair em tentação, mas livra-nos do Maligno.” (Mt 6,13); “Mas agora que vou para Ti, …, não te peço que os retires do mundo, mas que os livres do Maligno.” (Jo 17, 15). É sobretudo o Evangelho segundo S. João que sublinha esta luta.
Jesus experimentou a angústia no Jardim das Oliveiras, e rezou, do meio dessa angústia (Lc 22, 42-44). Pediu ao Pai que, se fosse da sua vontade, afastasse dele a paixão e a cruz. Fê-lo porque é um homem sensato, não ama o sofrimento. Pede com confiança, mas sujeitando-se à decisão do Pai. Acredita que o Pai pode tudo; mas não sabe, enquanto homem, se o Pai o vai salvar: viu muitos justos a perecer.
A oração do Jardim das Oliveiras parece-me menos consentânea com a ideia tradicional de que o Pai e Ele tinham decidido desde sempre que morreria pela salvação do mundo. Mas Jesus sabe que a paixão do justo é redentora, sabe que o Pai tem aceite que muitos justos sofram e morram por causa da verdade, por amor. Não sabe. Entrega-se. A Epístola aos Hebreus tem um comentário singular: “(…) apresentou orações e súplicas Àquele que o podia salvar da morte (…) e foi atendido por causa da sua piedade. Apesar de ser Filho de Deus, aprendeu a obediência no sofrimento, e, tornado perfeito, tornou-se fonte de salvação (…)” (Heb 5, 7-10).
Quanto a nós, sucede-nos desistir de orar, por descrença ou por cansaço; teimar com Deus, para que Ele cumpra; entrar na atitude “virtuosa” de “deixar que Ele resolva como quiser”. A boa atitude é a que Jesus nos recomendou e de deu exemplo.