1. Páscoa quer dizer passagem. Esta palavra é uma expressão religiosa que nasceu na libertação do Povo de Israel que, ao sair do Egipto, caminhou 40 anos para chegar à Terra Prometida. Infelizmente a dimensão religiosa da Páscoa que continuou através dos séculos, na experiência dos cristãos, perdeu o seu sentido original. Para a grande maioria a Páscoa é oportunidade de férias, é tempo para fazer viagens, quando muito é ocasião para visitar lugares onde as práticas religiosas são mais extravagantes. São conhecidas as procissões de Sevilha, as crucifixões nas Filipinas, ou os espectáculos pascais de Oberammergau. É preciso que os cristãos redescubram o significado da Páscoa.
• Na descrição do Antigo Testamento, quer no Livro do Êxodo, quer no Livro dos Números, a Páscoa relembra e comemora a passagem do anjo exterminador que vitimizou os primogénitos do Egipto; a passagem do Mar Vermelho que permitiu ao Povo de Israel distanciar-se dos exércitos do Faraó; os 40 anos de deserto que permitiram chegar à Terra Prometida por Deus.
• No Novo Testamento, a Páscoa tem um significado muito mais profundo. Cristo é a nova Páscoa, Ele próprio o Filho de Deus que veio ao mundo; a Páscoa celebra a Paixão, Morte e Ressurreição de Cristo; Cristo, o Cordeiro Pascal, traz à humanidade a redenção prometida por Deus; a Igreja centrada na pessoa de Jesus Cristo empenha-se pela grande transformação da sociedade para que ressuscite na justiça e na paz.
• Na tradição da Igreja, a Páscoa é celebrada ao longo de uma Semana Maior que, percorrendo o mistério de Jesus, propõe o desafio da Ressurreição, não apenas das pessoas, mas da comunidade toda. “Para que todos tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10, 10).
2. A Páscoa cristã é para ser vivida por todos os cristãos. O seu fundamento é a Ressurreição de Cristo, o seu processo é a conversão de cada um, o seu fim é a transformação de toda a humanidade. Cristo teve dois grandes actos sacerdotais: a Palavra e a Páscoa. Pela Palavra Ele iluminou a humanidade com um novo quadro de valores. A proposta foi tão violenta que lhe custou a vida. A Páscoa é exactamente a passagem da morte à vida, da Paixão e Morte à Ressurreição. Pela Páscoa os cristãos fazem a experiência da Morte e da Ressurreição de Cristo.
• Jesus celebrou a Páscoa com os seus discípulos, e na celebração ritual introduziu a Eucaristia. O novo Cordeiro Pascal é Ele próprio feito presença viva no pão e no vinho repartidos.
• Jesus viveu a Páscoa com as multidões que O aclamaram ao entrar na cidade e com as mesmas multidões que cinco dias depois O preferiram a Barrabás na sentença de morte. Cumpria-se em Jesus o que já os romanos haviam dito, que o Capitólio está perto da rocha Trapeia, isto é, que a glorificação fica sempre perto da condenação. Jesus sofreu a morte dos escravos mas, pela Ressurreição, deixou o túmulo vazio e apareceu por 11 vezes aos discípulos que O tinham abandonado.
Todo este conjunto de factos revela uma passagem da morte à vida, desafio para que todos os que seguem Jesus saibam vencer as mortes para celebrar a vida.
3. A Comunidade Paroquial do Campo Grande quer viver a Páscoa como passagem da morte à vida. Iluminados por Cristo queremos olhar à nossa volta, detectar os problemas da sociedade, acolher as razões de esperança, e comprometermo-nos em atitudes de comunhão. Jesus em plena Última Ceia soube dizer aos discípulos “que todos sejam um, como Tu ó Pai és um em mim, e, por isso o mundo vai acreditar” (Jo 17, 21). A Páscoa do mundo, a sua ressurreição está dependente da unidade dos cristãos. À nossa volta há inúmeras situações de sofrimento, a que só é possível responder com a nossa unidade. Com razão João, na sua Primeira Carta, dizia “que a minha comunhão convosco seja também comunhão com o Pai e com o seu Filho Jesus Cristo” (1Jo 1, 3). De facto, a comunhão fraterna permite-nos acolher a todos, sobretudo aos mais pobres e aos que mais sofrem. Esta comunhão fraterna, porém, não é possível sem a comunhão com o Pai e com o seu Filho Jesus Cristo. A Ressurreição Pascal que estamos a preparar exige-nos três atitudes: ver, julgar, agir. É a revisão de vida, essencial ao cristão no mundo.
• Ver a realidade do tempo presente: há muito sofrimento no nosso tempo. Uma crise global com problemas concretos de desemprego, de rotura familiar, de falta de meios essenciais, de perda da própria casa, de insuficiência para manter o “status” a que se tem direito.
• Julgar à luz do Evangelho: perguntamo-nos muitas vezes se, como Jesus fez, tentamos resolver os problemas dos outros com a generosidade indispensável para eles sentirem a mão amiga de Deus.
• Agir no concreto da vida: descobertos os problemas, precisamos de reinventar a caridade, permitindo aos que precisam a solução das carências mais urgentes.
Tudo isto é uma dimensão pascal. Se celebramos a Páscoa no templo (as liturgias do tempo pascal), temos de aprender a celebrar a Páscoa no tempo tratando com eficácia a ordem temporal, injectando nela a verdade, a justiça e o amor.
4. A Páscoa está por fazer. Este ano, com as privações de tantos, os cristãos têm o dever de reinventar a Páscoa, como expressão concreta de ressurreição, isto é, a ultrapassagem das dificuldades com o amor concreto de quantos ainda podem repartir.