1. Quando em 1977 se reuniu o Sínodo dos Bispos sobre a catequese surgia uma reflexão na Igreja que iria alterar a formação cristã, quer das crianças, quer dos adultos. De facto, a palavra catequese tinha uma estranha carga negativa. Considerava ser ela uma aprendizagem de fórmulas, uma série de perguntas e respostas, num processo sistemático de memorização. Cristão era considerado aquele que, passando pelos bancos da catequese até à 4ª classe, tinha aprendido umas quantas definições, celebrava de tempos a tempos uns sacramentos, e, finalmente, considerava ter feito o percurso integral da aprendizagem para ser cristão. O Sínodo dos Bispos veio alterar profundamente esta maneira de ver as coisas. Dois anos mais tarde, em 1979, já com João Paulo II no pontificado, um documento notável, a Cathechesi Tradendae, abria perspectivas diferentes à formação continuada dos cristãos.
• A catequese é a iniciação à vida cristã (CT 21). Ela revela a Pessoa de Jesus Cristo como alguém com quem o cristão se identifica; ela afirma os valores essenciais a uma vida cristã, como sejam a verdade, a justiça, a liberdade, o amor; ela inicia progressivamente o cristão numa vida sacramental que se projecta no seu quotidiano.
• Todos os cristãos vivem ao longo da vida um processo catequético de reiniciação ou de aprofundamento da fé. Ninguém chegou ainda à plenitude da estatura de Cristo. Por isso vivemos em catequese permanente.
• A maioria dos cristãos não são mais do que catecúmenos (CT 43 e 44). Esta é uma verdade objectiva porque muitos cristãos cresceram na cultura, nas ciências, nas artes, mas em termos de fé não ultrapassaram a catequese dos primeiros anos. Os valores aprendidos e experimentados até aos 10 anos não suportam as exigências da fé num estado adulto.
A partir da década de 80 tornou-se um imperativo reformular o processo catequético. Se até aí tudo se resumia ao Credo, aos Mandamentos e aos Sacramentos, a partir da Exortação Pastoral tornou-se fundamental compreender em Cristo o Mistério da Criação, o processo da Redenção, a dinâmica da Santificação, tudo isto realizado por Cristo, com Cristo e em Cristo.
2. O caminho da fé exige coordenadas, pontos de referência que permitam o normal crescimento na adesão à Pessoa de Jesus. A partida centra-se na adesão incondicional à Pessoa de Jesus Cristo. Se Cristo está vivo, se Cristo está connosco, sempre, desde há 20 séculos, se Cristo vai permanecer connosco até ao fim dos tempos (cf. Mt 28, 20), então importa descobrir as coordenadas da adesão à sua Pessoa, através das quais cada um se torna mais cristão. Este foi o problema dos três mil homens que na manhã de Pentecostes ouviram Pedro afirmar claramente que Jesus ressuscitara. Então perguntaram: o que temos que fazer? (Act 2, 37). A resposta de Pedro define seis atitudes fundamentais para ser cristão:
• Reconhecer a senhoria absoluta de Cristo: o cristão não tem outro Senhor. Nem o dinheiro, nem o poder, nem o mais fácil, nem a ideologia, nem a liderança, nem um benfeitor, constituem referência para os comportamentos cristãos, apenas na senhoria absoluta de Cristo se encontra a razão de ser de todas as opções.
• Arrepender-se de tudo o que na vida foi errado: só uma consciência recta permite avaliar comportamentos. O cristão que reconhece os seus erros e deles se arrepende tem sempre um Deus de misericórdia para o acolher. O arrependimento é o primeiro passo de um caminho novo.
• Deixar-se conduzir pelo Espírito: Jesus disse-o claramente quando, ao partir, deixou o Paráclito, o Espírito de Verdade que ensinará toda a verdade. Com razão Paulo pôde dizer “só os que se deixam conduzir pelo Espírito são de verdade filhos de Deus” (Rm 8, 14).
• Aceitar o testemunho daqueles que os precederam na fé: nas primeiras comunidades, tal como hoje, há os “santos” que, tendo-se identificado plenamente com Cristo, dão um testemunho de fé inabalável que, nalguns casos, levou ao martírio.
• Celebrar expressões sociais da fé: os Sacramentos são esses sinais “que exprimem a fé e a fortalecem” (CDC can. 840). Era por isso que nas primeiras comunidades todos os que conheciam os Apóstolos e aceitavam caminhar com eles recebiam o Baptismo e partilhavam depois a Eucaristia.
• Viver em comunidade: é maravilhosa a vida dos primeiros cristãos porque “estavam unidos na doutrina dos Apóstolos, na fracção do pão, nas orações e na Eucaristia; tudo o que tinham punham em comum, não havia necessitados entre eles e aumentava cada dia mais o número daqueles que aderiam à pessoa de Jesus” (cf. Act 2, 42-47).
São estas as grandes coordenadas do catecumenato quer daqueles que se preparam para o Baptismo, quer daqueles que querem crescer na sua fé e nela ficarem comprometidos. Só estes passarão de catecúmenos a cristãos presentes e activos na Igreja e no mundo.
3. Todo o cristão tem o dever de aprofundar a sua fé, sem o que nunca será apóstolo. O cristão, quem quer que seja, criança, jovem ou adulto, leigo ou sacerdote, com vasta cultura ou no princípio da sua alfabetização, todo o cristão tem o dever de aprofundar a sua fé. Há cinco maneiras de crescer nesta “adesão incondicional à Pessoa de Jesus Cristo”:
• Pela catequese de adultos, integrando um grupo de cristãos que discutem os problemas, os iluminam com a luz do Evangelho e se comprometem a resolvê-los com atitudes cristãs.
• Pelo testemunho que se dá aos outros ou que se recebe dos outros, sabendo porém que o testemunho cristão consiste em “acolher e compreender toda a gente, ser solidário para com os mais pobres, e viver em comunhão com o povo de que se faz parte” (EN 21).
• Pela oração que, além de encontro e diálogo com Deus, é experiência vital de Jesus Cristo e, ao mesmo tempo, é compromisso de vida vivida nas exigências do Evangelho.
• Pela acção organizada, única forma de ser eficaz no apostolado a que cada um se propõe. Só inserido numa comunidade de vida se descobrem as formas de ser eficaz na concreta transformação do mundo. O verdadeiro apostolado não consiste apenas em tentar converter pessoas, deve promover a mudança das estruturas, aquelas onde é preciso estar a justiça, a solidariedade, o desenvolvimento, a paz.
• Pela partilha de bens que é muitas vezes a mais bela forma de revelar o amor fraterno. Poder partilhar o supérfluo, ou oferecer mesmo alguma coisa que se justificava ter, é um sinal claro de que a referência fundamental na vida é a Pessoa de Jesus Cristo, que se fez pobre para todos participarem da sua riqueza.
Há um caminho imenso a percorrer para a grande maioria dos cristãos que são apenas quase catecúmenos. Pede-se-lhes que queiram aprofundar a fé e que, depois, queiram expressá-la não com palavras, mas com o testemunho de vida.
4. A comunidade cristã do Campo Grande tem grupos de adultos que aprofundam a fé, sob o modelo de reflexão catequética, com a inspiração de Teilhard de Chardin, com a exigência da revisão de vida, como forma de preparação para o Crisma, ou mesmo para o Sacramento do Matrimónio. Muitas são as propostas da comunidade para, a pouco e pouco, os cristãos deixarem de ser quase catecúmenos e se tornarem cristãos comprometidos.