1. O tempo da Quaresma desde sempre foi considerado tempo de penitência e, por isso, como um convite ao jejum, à oração e à esmola. Há, porém, uma dimensão que tem sido esquecida, o sentido da festa. De facto, se a Quaresma é tempo também de Reconciliação, daí resulta, para o cristão, uma alegria intensa pelo reencontro com Deus e pelo perdão dos irmãos. Quem lê o Evangelho apercebe-se da alegria daquele que se reencontrou com o projecto de vida que abandonara. Este momento é fonte da serenidade e da paz que transforma em festa o tempo da Reconciliação. As parábolas do perdão, a oração do Pai-Nosso, a garantia dada por Pedro na sua Carta, tudo converge para transformar o sacramento da Reconciliação em tempo de alegria vivida por toda a comunidade cristã.
• O Filho Pródigo – o reencontro do filho com o pai carregado de misericórdia é um momento tão forte que o rapaz nem oportunidade tem de contar a sua história. O pai manda vestir-lhe a túnica da festa, põe-lhe o anel no dedo, e manda matar um novilho gordo. Tudo isto são sinais de alegria porque “o filho estava morto e reviveu, estava perdido e encontrou-se” (Lc 15, 32).
• A ovelha perdida – a história do pastor que deixou as 99 ovelhas no aprisco e foi à procura daquela que se perdeu, é a história da ternura de Deus para com aquele que alguma vez se afastou. Daí a sua expressão “há mais alegria no céu por um pecador que se converte do que por 99 justos que fazem penitência” (Lc 15, 7).
• A dracma perdida – também esta mulher quis fazer festa com as amigas, porque reencontrara a moeda que julgava ter perdido. Igualmente há alegria no Céu por um só pecador que se converte.
• O Pai-Nosso – a oração que Jesus quis ensinar aos seus discípulos, convida não só a pedir perdão mas a ter alegria ao oferecer o perdão aos outros. A Reconciliação é reciprocidade no perdão; celebra-se na certeza de que Deus perdoa, na medida em que o pecador é capaz de perdoar também.
• A garantia de Pedro – na sua Primeira Carta, Pedro soube dizer que “Cristo morreu uma só vez pelos pecados – o Justo pelos injustos – para a todos conduzir a Deus” (1 Pe 3, 18). A Reconciliação está assegurada pelo perdão radical que Jesus, na Sua Morte e Ressurreição, a todos oferece.
Ao compreender a misericórdia de Deus, o cristão sabe que o perdão lhe foi oferecido, Deus perdoa sempre. É a “amnistia geral”. Neste tempo de Quaresma os cristãos apercebem-se melhor do mistério da Reconciliação que incondicionalmente o Senhor oferece, não num julgamento, mas num acto de amor.
2. O Sacramento da Reconciliação também deve ser preparado. Com uma consciência recta avalia-se aquilo em que se não foi tão perfeito. Todo o Sacramento é um sinal que exprime a fé e a fortalece. Pelo Sacramento da Reconciliação exprime-se a confiança ilimitada na misericórdia de Deus e experimenta-se a força para tentar não pecar jamais. Se o perdão de Deus é total, o homem mantém no entanto a sua habitual fragilidade. Por isso, é importante avaliar-se, com alguma exigência, mas com uma ilimitada confiança. Se se quisesse elencar uma boa avaliação de consciência, poderia ter-se em conta várias situações de vida:
• A relação com Deus – que lugar tem Deus na minha vida? Até que ponto me encontro com Ele a sós? De que forma lhe confio a minha vida? Falo com Ele como um amigo fala a seu amigo? Aceito as suas orientações?
• A relação com os irmãos – dou atenção aos outros? Preocupo-me com os mais pobres e os que mais sofrem? Digo sempre a verdade? Reservo-me não dizer mal de ninguém? Trato a todos por igual? Perdoo a todos os que me ofendem?
• O mundo do trabalho – procuro ser competente? Sou solidário com os companheiros? Preocupo-me com a inovação para ser mais eficaz? Se possível, dou trabalho aos outros? Respeito a todos no meu dia-a-dia?
• A vida de família – procuramos a comunhão total? Perdoamo-nos mutuamente nas dificuldades? Repartimos o que temos e somos? Cultivamos a alegria? Respeitamos o cansaço dos outros? Repartimos o trabalho?
• A responsabilidade social – sentimo-nos membros activos da família humana? Assumimos a intervenção política como cristãos? Sabemos ser críticos sem provocar roturas? Batemo-nos pelo bem comum? Aceitamos as dificuldades de todos?
• A administração económica – temos consciência de que somos apenas administradores dos bens materiais? Assumimos que o supérfluo é para distribuir pelos mais pobres? Entendemos que investir é uma forma privilegiada de pobreza cristã, na ajuda aos irmãos? Relativizamos as dificuldades do tempo presente?
Estas e muitas outras questões pode cada um levantar ao avaliar a sua consciência na procura da perfeição que a Reconciliação recomenda. É maravilhoso saber que no Sacramento da Reconciliação, quem em nome de Deus dá o perdão é também pecador. Muitas vezes com mais dificuldades do que aqueles que ao seu lado lhe pedem a “absolvição”.
3. “A Missão Metrópoles” na cidade de Lisboa dá especial atenção, por vontade de Bento XVI, ao Sacramento da Reconciliação. Redescobrir este Sacramento, torná-lo um Sacramento de festa, mobilizar para ele toda a comunidade são expressões lindíssimas da Nova Evangelização. Por isso, a nossa cidade de Lisboa está aberta à alegria deste Sacramento.
• As sextas-feiras da Reconciliação – em cada sexta-feira da Quaresma estão abertas algumas igrejas da cidade durante o dia inteiro, com sacerdotes disponíveis para oferecer aos fiéis que os procuram a alegria deste Sacramento.
• As celebrações comunitárias – em muitas paróquias, o Sacramento é celebrado com uma grande liturgia da Palavra em que, antes do sacramento da Reconciliação pessoal, se celebra a Palavra que prepara o reencontro com Deus e com os irmãos. Com cada cristão a comunidade inteira se alegra na festa do Perdão.
• A Noite da Misericórdia – é a 23 de Março que a Comunidade Paroquial do Campo Grande se reúne em festa de Reconciliação. Durante o dia inteiro, a igreja está aberta, os sacerdotes disponíveis para o perdão circular com o dom de Deus que acolhe, que absolve, que diz “vai em paz, não tornes a pecar”. À noite, far-se-á a Festa da Misericórdia. São os jovens que nos conduzem para a alegria do perdão.
• A Via-Sacra da Misericórdia – nesse mesmo dia, às duas e meia da tarde, celebraremos a Via-Sacra, sentindo como em cada passo, no caminho da Cruz, se aprende com Cristo a riqueza da misericórdia de Deus, “feito obediente até à morte, e à morte de Cruz” (Fil 2, 8). Será mais uma forma de preparar a Reconciliação com Deus e com os irmãos.
Participar nesta festa global do perdão permite a cada um compreender a riqueza do sacramento da Reconciliação e, ao mesmo tempo, a alegria que dele vem para toda a comunidade cristã.
4. Convidam-se todos os cristãos da nossa comunidade a celebrar nesta Quaresma o Sacramento da Reconciliação.