CELEBRAR O ANO DA FÉ – 17 de Junho de 2012

1. Para viver o Jubileu do Concílio Vaticano II, depois de 50 anos da vida da Igreja, Bento XVI quis instituir o “Ano da Fé” que se inicia em Outubro de 2012, com o Sínodo dos Bispos e termina no Dia da Santíssima Trindade em 2013. O motu próprio “A Porta da Fé” é o documento fundante deste grande acontecimento da Igreja Católica. De facto, a Fé é a porta de entrada no mistério de Cristo e da Igreja. É através dela que se entra no caminho da salvação, é nela que se encontra a garantia da felicidade, no tempo e para além do tempo. Todos os cristãos são convidados a reviver a sua fé e a renová-la na sua vida cristã. Recordo-me de em 1975 ter participado pela primeira vez numa reunião promovida pela Santa Sé. Eu estava ali em representação da Conferência Episcopal Portuguesa. O tema era “Os jovens e o futuro da fé na Europa”. A páginas tantas, um teólogo sueco afirmou que só uma fé que é suficientemente criticada pode vir a ser uma fé verdadeiramente sentida. Quando começa o Ano da Fé, recordo este dito de um teólogo vindo dos países nórdicos, onde se não é maioritariamente católico. Penso que Bento XVI exige aos cristãos criticarem a sua fé, muitas vezes ainda infantil, para chegarem a uma fé adulta de compromisso cristão. Mas afinal, o que é ter fé? À partida pode dizer-se que é a adesão incondicional à pessoa de Jesus Cristo. Mas, este encontro com Cristo supõe três momentos:

• Credere in Christo, isto é, confiar em Jesus Cristo – esta é a maneira mais fácil de acreditar. Se na vida se confia em tanta gente, compreende-se que facilmente se confie em Jesus Cristo que se sabe ser o Filho de Deus. É a primeira etapa da fé.

• Credere Christum, isto é, conhecer bem a pessoa de Jesus Cristo – talvez seja aqui que os cristãos encontram maior dificuldade. A catequese de infância ensinou muita doutrina, mas talvez não tenha revelado suficientemente a pessoa de Jesus Cristo que importa conhecer, sobretudo através da Palavra de Deus. Muitos ainda não passam do Cristo histórico, faltando-lhes conhecer a pessoa de Jesus, o Verbo de Deus que o Senhor enviou para salvar o mundo. Se ninguém ama o que não conhece, amar Jesus implica conhecê-l’O de verdade.

• Credere in Christum, isto é, comprometer-se com a pessoa de Jesus Cristo – a fé não pode ser apenas um conhecimento de doutrinas, é uma relação pessoal com Jesus. E as relações profundas comprometem aqueles que se amam. Daí a afirmação de Tiago: a fé sem obras é morta (cf Tg 2, 17).

Foi Santo Agostinho que no séc. IV fez esta reflexão sobre a fé. Passados tantos séculos, só uma fé com estas três dimensões, confiança, conhecimento e compromisso, é uma fé adulta, uma fé verdadeira.

2. Cada um de nós tem a história da sua fé. Fazer essa história ajuda-nos a percorrer os caminhos que a cada um levaram ao conhecimento de Jesus e ao compromisso no seu projecto. Para entender as experiências vividas por cada um, vale a pena recordar os grandes testemunhos da fé no Antigo e no Novo Testamento.

• A fé de Abraão tem muito da minha fé. Ele conheceu Deus e abandonou-se ao seu projecto de tal maneira que se tornou referência de fidelidade.

• A fé de Moisés contém muito da minha esperança. Deus tinha visto o sofrimento do Povo e decidira libertá-lo. Precisou de um líder e escolheu Moisés. Moisés com uma história complicada aceitou o desafio e tornou-se, com Deus, libertador.

• A fé de Maria é a expressão máxima do amor que está em mim. Perante o desconhecido, embora com algum discernimento, ela abandonou-se sem limites “servirei o Senhor como Ele quiser”. Foi a confiança até às últimas consequências. Maria ficará de pé, até junto à cruz.

• A fé de Pedro tem o meu perfil de pecador. Ele afirmara que não abandonaria nunca o Senhor. Tinha-lhe dito que podia contar com ele. Na hora menos esperada, porém, acabou por negá-l’O. Como pecador, porque acreditava em Jesus, chorou amargamente.

• A fé da Cananeia revela a minha fé confiante, quando tudo parece perdido. Esta mulher de quem não se sabe o nome acreditou que a insistência na súplica poderia curar-lhe a filha. Cada um de nós também é muitas vezes estrangeiro com a certeza de que Jesus o não esquece, o acolhe, o ama.

• A fé do Centurião é a minha fé tantas vezes cheia de dúvidas. Quando os céus se rasgaram e as trevas cobriram a terra, o centurião acabou por confessar: “este homem era verdadeiramente o Filho de Deus” (Mc 15, 39).

Ao fazer cada um a narrativa da sua fé, compreende que a sua adesão incondicional à pessoa de Cristo é absolutamente original. Tem uma história própria à qual importa ser fiel, apesar de todas as dificuldades. É que não se acredita em doutrinas, acredita-se numa pessoa viva em quem se joga a própria vida.

3. A fé supõe um itinerário. É a pouco e pouco que cada um se apercebe da presença de Jesus na sua vida e procura estabelecer com Ele uma relação. É verdade que Bento XVI define três linhas de orientação para poder viver-se o Ano da Fé. Aprofundar a fé, celebrar a fé e testemunhar a fé são os grandes objectivos para o Ano Pastoral em que a Igreja inteira se debruça sobre o mistério da fé cristã. Agora, na vida de cada um e até na vida de cada comunidade é preciso ter consciência de que há passos concretos que, a partir do despertar da fé, é necessário dar para chegar a uma fé consciente, livre, activa e responsável.

• A fé começa sempre com um encontro com a pessoa de Jesus – muitas vezes Jesus foi uma surpresa na nossa vida. Tentando conhecê-l’O melhor, acabámos por apaixonar-nos por Ele e tudo se alterou. Passámos a ver as pessoas, as coisas, as situações com os olhos de Deus, com um olhar salvífico.

• A fé exige sempre um compromisso de vida – há experiências de Deus que permitem compreender que qualquer acontecimento não foi um mero acaso. Estava inserido num projecto global onde se descobre a melhor parte que nunca nos será tirada (cf. Lc 10, 32).

• A fé vive-se no testemunho cristão – que é acolhimento e compreensão de todos e solidariedade para com os mais pobres. Na família, no trabalho, na acção social, na intervenção, na cidade, o cristão marca a diferença pelos valores que persegue e pelas atitudes que toma.

• A fé alimenta-se na Palavra de Deus – “tendo outrora Deus falado a nossos pais pelos profetas, hoje fala-nos por intermédio de seu Filho, Palavra Viva” (cf. Hb 1, 1-2). A oração verdadeira escuta a Palavra, porque nela está Cristo vivo.

É por este itinerário de fé, com as normais etapas, que cada um de nós cresce como cristão para servir a Igreja e o mundo, para transformar a história humana, para a todos proporcionar caminhos de salvação.

4. O Programa Pastoral da nossa Paróquia do Campo Grande 2012/2013 que vai começar em Setembro, terá a preocupação de a todos inserir no crescimento da Fé. Se a fé sem obras é morta, todas as obras e relações na Paróquia deverão estar inspiradas na pessoa de Jesus Cristo, Salvador e Redentor.

P. Vítor Feytor Pinto
 Prior

Comments are closed.