1. Na proximidade do Natal, multiplica-se o ruído de tal maneira que se corre o risco de perder a paz. Podem ser bonitas as luzes na cidade, são agradáveis os cantos das crianças com vozes que parecem de anjos, podem encher-se os armazéns para que as pessoas escolham presentes para oferecer. Tudo isto, porém, é vivido numa tensão imensa que torna este tempo de Advento, tempo de agitação, de barulho, de insegurança. Por tudo isto, os cristãos são convidados a encontrar tempos de silêncio em que possam falar com Deus, preparando assim o nascimento de Jesus. No tempo da libertação do Povo de Israel, também o acampamento dos israelitas, no seu caminho para a Terra Prometida, tinha imenso barulho e agitação. Isto levou Moisés a mandar construir uma tenda fora do acampamento, para ali no silêncio falar a sós com Deus, como um amigo fala a seu amigo (cf Ex 33, 7-11). Já no tempo de Jesus, em conversa com os discípulos, o Senhor recomendava que cada um se fechasse no seu quarto para ali, sem muitas palavras, conversar com Deus (cf Mt 6, 5-11). Quando o barulho toma conta da cidade, os cristãos devem saber fazer silêncio para se encontrarem com o essencial e configurarem com Ele a sua própria vida. Os presépios que se multiplicam nas casas, nas escolas, num ou noutro lugar público, deverão provocar tempos de recolhimento e de silêncio na espera do Senhor que vai chegar.
• Nas famílias é tempo de criar espaços de reconciliação, de amor e de ternura. Se ao longo do ano houve tensões, ao chegar o Natal impõe-se partilhar o perdão, reafirmar a confiança, exprimir o amor. Isso só será possível se em família houver tempos de oração, o que reclama o silêncio e afirma a presença de Jesus. Aliás, foi Ele que disse “onde estão dois ou três reunidos em meu nome, Eu estou no meio deles” (MT 18, 20).
• Nas escolas é tempo de ir muito além dos estudos das ciências e das letras. A educação pede que se cultivem os afectos, porque só neles se desenvolvem relações humanas justas e fraternas. A preparação do Natal é lugar privilegiado para ensinar a amar. Na simplicidade do presépio, com ou sem árvore de Natal, as crianças, os adolescentes, os jovens podem descobrir que, no silêncio, junto ao Menino Deus, se descobrem valores de uma cidadania verdadeira.
• Nas empresas é também tempo de reencontro entre as pessoas. Ao longo do ano aconteceram tensões, concorrências, roturas que é preciso superar. Enchendo as salas e os corredores de símbolos de Natal, gestores e trabalhadores têm oportunidade de redescobrir o valor da fraternidade. Não basta uma festa a distribuir presentes pelos filhos dos funcionários. São imperiosos momentos de silêncio que desafiam o coração a celebrar com todos a paz.
• Nos centros comerciais onde não falta o Pai Natal, com cordões dourados pelas paredes, com luzes e com estrelas a brilhar, é preciso multiplicar sorrisos que testemunhem o amor que vai nos corações. Se são importantes os interesses de marketing para dar continuidade à vida das lojas e dos cafés, mais importante é a forma de acolher, a serenidade no procurar, a simplicidade nas escolhas. É a aprendizagem de um Natal diferente que só é possível com o silêncio no coração.
Se não souber fazer-se silêncio neste tempo de preparação para o Natal, acontecerá que nenhum presente satisfaz, nenhuma palavra tem resposta, nenhuma atitude constrói a vida nova que Jesus traz ao mundo, ao renascer nas nossas vidas.
2. Preparar o Natal só é possível se se descobrir os lugares de silêncio onde cada um se tranquilize. Há quem desejasse isolar-se num retiro espiritual para ali aprofundar a sua fé e se preparar melhor para a vinda do Senhor, mas não pode porque o trabalho lho não permite. Também muitos quereriam, no seu dia-a-dia, fugir para uma igrejinha onde pudessem evadir-se do frenesim que os envolve de manhã à noite no autocarro, no trabalho, no almoço, no regresso a casa e até no diálogo com os filhos, mas também não conseguem tempo. Há muitos ainda que, no sofrimento motivado pela doença, pela dificuldade económica, pela solidão, não têm capacidade para serenamente aceitar os limites da vida. Como estas e outras dificuldades não se conseguem ultrapassar, pertence a cada um descobrir a sua forma pessoal de fazer silêncio. Como consegui-lo:
• Descobrir o momento do dia em que seja possível um certo isolamento. Um simples quarto de hora tirado à agitação quotidiana será sempre fonte de serenidade e de paz. Pode ser no intervalo do almoço, ou talvez de manhã mais cedo do que o acordar da casa, ou à noite quando os outros estão entretidos na televisão. É oportunidade de entrar no segredo do próprio quarto para ali falar com Deus como um amigo fala ao seu amigo.
• Ter um livro que oriente os momentos de reflexão. Bento XVI escreveu agora “A Infância de Jesus”. São textos que ao ler-se e reler-se, na profunda intimidade com Deus, revelam o verdadeiro rosto de Jesus que vai nascer. Na sua vida pública Jesus também se isolava para em silêncio falar com o Pai.
• Renovar-se nas orações habituais. Muitas vezes se cai na rotina, chegando mesmo a dizer-se palavras que já não são sentidas. No silêncio do Advento vale a pena reestruturar o programa de oração, sem esquecer a oferta do dia pela manhã, e a acção de graças ao anoitecer pelos dons recebidos. Pode ser altura de uma participação maior na Eucaristia, assumindo nela a comunhão com Deus e com os irmãos.
• No fim-de-semana talvez seja possível, em casal, com um filho, ou com algum amigo, dar um passeio à beira-mar, ouvindo o murmúrio das ondas, num pinhal sentindo a brisa da tarde, num jardim conversando com as flores. O silêncio vivido com outras pessoas é também enriquecedor. Pode recordar-se Santo Inácio que, ao passear com os companheiros num jardim, dizia às plantas para lhe não falarem mais de Deus, porque já lho tinham revelado suficientemente.
Inúmeras outras formas podem encontrar-se, de fazer silêncio, acalmando o coração. Assim se prepara melhor tudo o que há a fazer para que o Natal seja vivido com amor, testemunhando aos outros toda a ternura que a presença de Jesus contém.
3. Este tempo de Advento é um tempo privilegiado para a relação com Deus. Nas nossas comunidades cristãs oferecem-se muitas propostas para o aprofundamento da fé e a melhor preparação para a vinda do Senhor. São conferências sobre o Ano da Fé e o Concílio, são vigílias com meditações suficientemente exigentes, são celebrações da Palavra com o aprofundamento das profecias que revelavam a vinda do Messias, são cerimónias de Reconciliação e muitas outras experiências que podem enriquecer a preparação do Natal. Não há melhor exercício, porém, do que aquele que é construído pela escolha de cada um. Por isso se deixa o desafio: em algum tempo de silêncio, pense cada um como quer viver o seu tempo de Advento. Que momentos de contemplação para se preparar para a vinda do Senhor, que diálogos de amizade reveladores de uma intimidade essencial à vida cristã, que ocasiões de partilha com aqueles que lhe são mais próximos. Uma partilha de oração, mais importante do que qualquer outra. É cada um na sua experiência pessoal que consegue organizar-se para que o seu Natal seja verdadeiramente cristão. Tentação é um Advento de barulho, de agitação, de multiplicação de afazeres. O Natal verdadeiro, o do nascimento de Jesus, pede tempos de serenidade e de paz, os únicos que oferecem a alegria que vale a pena.
Pe. Vítor Feytor Pinto Prior