1. Na Liturgia da Palavra a Igreja convida os cristãos a prepararem-se para o nascimento de Jesus. Para tal, oferece-nos figuras extraordinárias que acabam por dar um sentido de exigência neste caminho que se faz até 25 de Dezembro. Infelizmente, a sociedade contemporânea oferece um conjunto de figuras que são, de per si, imperfeitas. Para o imaginário das crianças fala-se do Pai Natal carregado de presentes; para o interesse comercial multiplicam-se árvores de Natal com pinheiros cheios de luzes a brilhar para atrair clientes às lojas onde se gastam fortunas; para superar a pobreza de muitos, fica-se apenas por cabazes que são dados sem qualquer referência ao mistério de Jesus. Em muitas montras até aparecem trenós puxados por renas que no nosso clima quase ninguém conhece. Tudo isto são falsas figurações que acabam por desvirtuar a preparação do Natal. São três as verdadeiras figuras do Advento: os profetas da esperança, Maria, mãe de Jesus, e João Baptista, o percursor.
• Os profetas vêm ao encontro do Povo de Israel que, cheio de sofrimento, espera o Messias. Os filhos de Israel sofreram a destruição de Jerusalém e do seu templo, vivem o cativeiro da Babilónia, não sabem quando poderão regressar à sua terra. É neste ambiente de incerteza que Isaías garante a chegada do Emanuel, que quer dizer Deus connosco (cf Is 7, 14). Outros profetas iluminam de esperança o caminho dos cristãos. Jeremias, Baruc, Sofonias e Malaquias são portadores de mensagens maravilhosas que garantem a glória do Senhor. São todos estes os profetas da esperança.
• Maria soube dizer sim. À surpresa do anjo, com a sua saudação original, “Avé cheia de graça”, Maria responde com uma atitude de discernimento invulgar. Ela quer ter a certeza de que não está a viver um sonho, mas uma verdadeira chamada de Deus. O Anjo Gabriel dá-lhe uma garantia e um exemplo. A garantia é a de que para Deus não há impossíveis, o exemplo é Isabel que na sua velhice vai ter um filho. Perante isso, Maria abandona-se à vontade de Deus dizendo apenas: “servirei o Senhor como Ele quiser”. Ao sim de Maria deve corresponder o sim de cada cristão.
• João Baptista é o homem do deserto que Deus convida a proclamar a penitência como caminho para a salvação do Povo de Israel. No Rio Jordão baptiza na água, mas profeticamente acabará por anunciar aquele que era maior do que ele, o Messias, Jesus. “Eis o Cordeiro de Deus, Aquele que tira o pecado do mundo” (Jo 1, 29). “Que Ele cresça e que eu diminua” (Jo 3, 30), “Ele baptizar-vos-á no Espírito e no fogo” (Lc 3, 16). Com estas expressões anunciava a chegada de Jesus, o primeiro do reino de Deus a proclamar. João constitui um desafio para os cristãos que não podem ter medo de testemunhar Cristo em toda a parte.
Estas grandes figuras do Advento, sem dúvida que preparam os crentes para o nascimento de Jesus. Hoje como nunca é urgente a esperança. Não é possível ser cristão sem dizer sim às propostas do Evangelho. E proclamar os valores do Reino é missão continuadora da profecia que João Baptista realizou no seu tempo. As figuras do Advento desafiam a caminhar ao encontro de Jesus no próximo Natal.
2. A Palavra de Deus que nos oferece estas figuras do Advento convida a uma reflexão profunda sobre o essencial da vida cristã. O caminho de preparação para o Natal deve fazer crescer em cada cristão a consciência da sua vocação original, seguir Jesus Cristo incondicionalmente em todas as situações da vida. Se a simplicidade do presépio, na poesia que o envolve, faz apelo a cada um se tornar como criança para aceitar o mistério de Deus, outros momentos da vida de Jesus irão chamar a valores do Evangelho como a verdade, a justiça, o amor e a paz. Nesta perspectiva o Advento é tempo de conversão, ocasião de mudança de vida. À luz do Advento consegue-se a libertação do egoísmo, a aventura da partilha, o mistério da reconciliação, a força de uma vida que se renova para o serviço dos outros. A Palavra de Deus será então o esteio no crescimento da fé, da esperança e da caridade.
• A Palavra com a Fé permite acolher a revelação. É através da Palavra que se conhece a Pessoa de Jesus Cristo a quem o crente adere sem condições. Conhecer Jesus como Filho de Deus que veio ao mundo para realizar a obra da Redenção provoca uma total e completa entrega no sonho de vida que Jesus nos propõe.
• A Palavra com a Caridade relativiza tudo o que o mundo considera bem, o prestígio, a influência, a riqueza, a arrogância, levando à descoberta da solidariedade. Cada cristão pode depois afirmar-se em gestos de acolhimento, de perdão e de partilha. A Palavra de Deus que fala tanto de amor é um desafio permanente para se amar sempre mais a Deus e aos irmãos.
• A Palavra com a Esperança garante uma promessa maravilhosa, a de que “desfeita a tenda do exílio terrestre se adquire no céu uma habitação eterna” (2Cor 5, 1). Mas a esperança cristã não se centra apenas na vida eterna, bem ao contrário, dá coragem para viver com alegria as normais dificuldades da vida, a ter capacidade de descobrir o positivo de todas as coisas, a força interior para recomeçar em cada “curva do caminho”. Alimentado pela Palavra de Deus, o cristão não pára perante o sofrimento, assume-o à semelhança de Jesus que, obediente ao Pai, nascendo por amor, pelo mesmo amor foi capaz de dar a vida.
As virtudes teologais da Fé, da Esperança e da Caridade são por excelência virtudes do Advento, porque na Fé O reconhecemos sempre, na Esperança temos consciência da Sua segunda vinda e na Caridade O tornamos presente na vida dos irmãos.
3. Neste Ano da Fé somos convidados a revisitar o Concílio. E facilmente se reconhece que a Igreja e as comunidades cristãs têm também uma missão profética, uma vocação redentora e gestos novos de autêntica caridade. É a Igreja a repetir as três grandes figuras do Advento. De facto, o mundo contemporâneo precisa de ser confrontado com os valores que perdeu e que a Igreja continua a anunciar. Este mesmo mundo tem de renovar-se percorrendo caminhos novos com métodos diferentes, que lhe possam ser verdadeira redenção. Tem, finalmente, que multiplicar gestos de amor, porque são demasiados os que sofrem a fome, o frio e a nudez. As figuras do Advento têm que ser recriadas pela Igreja, Povo de Deus.
• A missão profética obriga a Igreja a denunciar tantas e tantas situações que magoam os homens nossos contemporâneos. Depois, é urgente propor alternativas que sejam de verdade salvadoras. Finalmente, Bispos, sacerdotes e leigos devem estar na primeira linha no serviço aos mais pobres e aos que mais sofrem. Todos estes gestos são sinais que devolvem a esperança.
• A missão redentora leva as comunidades cristãs a organizarem-se de tal maneira que, através da proximidade, ninguém se sinta só, caído à beira do caminho. Dentro de cada comunidade deve ouvir-se o grito que Jesus um dia lançou “vinde a mim todos os que estais cansados e oprimidos que Eu vos aliviarei” (Mt 11, 28). A redenção, sendo oferecida a todos, privilegia sobretudo os mais pobres e os que mais sofrem.
• A missão social convida a proclamar que a salvação está próxima, mas depende de cada um fazê-la surgir nos seus ambientes. É cada cristão que na família, no trabalho, no seu meio social é capaz de proclamar Jesus, não que vem no próximo Natal, mas que já está entre nós como luz que brilha nas trevas. Proclamar Jesus Cristo pelo testemunho e pela palavra oportuna é tarefa de qualquer cristão consciente e responsável.
Estas três missões permitem entender que as figuras do Advento contagiam a Igreja inteira na sua realidade de presença no mundo para o transformar.
4. Está mesmo a chegar o Natal. Será cada um de nós capaz de pegar nestas figuras do Advento e descobrir como é que cada uma delas pode motivar o seu peregrinar diferente para o Dia de Natal? É o trabalho de casa que é proposto a todos os membros da nossa comunidade paroquial.
Pe. Vítor Feytor Pinto