1. A Páscoa, para os cristãos, é a celebração da Ressurreição de Cristo. De muitas maneiras Jesus anunciara que iria morrer em Jerusalém. Falou nisso aos discípulos predilectos, Pedro, João e Tiago, quando se transfigurou no Monte Tabor (cf. Lc 9, 31). Também se comparara a Jonas que depois de três dias no ventre da baleia, fora entregue a Ninive para anunciar a penitência (cf. Mt. 16, 4). Dissera-o com toda a clareza, quando na proximidade da Samaria, caminhava para Jerusalém (cf. Mt 16, 4), ou quando Pedro, surpreendido com a notícia da morte de Jesus, dizia que tal não poderia acontecer (cf. Mc 8, 31). Nestas e noutras situações Jesus revelava saber que a perseguição o esperava na Cidade Santa, onde seria entregue aos seus inimigos que o condenariam à morte na cruz. Ao terceiro dia, porém, Jesus ressuscitou. E é esta Ressurreição que os cristãos celebram nas festas pascais. Toda a Páscoa supõe uma passagem, da morte à vida, da opressão à liberdade, do pecado à graça de Deus.
• A Páscoa judaica celebrava a libertação do povo hebreu que, depois de 400 anos de cativeiro no Egipto e após 40 anos de deserto, chegava à terra da liberdade, a Terra Prometida onde corria o leite e o mel.
• A Páscoa de Cristo é vivida ao longo de três anos quando Jesus anuncia a Boa Nova aos pobres e a libertação aos oprimidos, atraindo sobre si, por isso, a perseguição do sinédrio. Será condenado no tribunal religioso, no tribunal político, no tribunal popular. Morrerá crucificado e será depositado num sepulcro novo mas, ao terceiro dia, ressuscitará.
• A Páscoa dos cristãos será vivida através dos séculos numa conversão permanente. Libertos do pecado e da tentação, podem agora os cristãos viver o tempo da reconciliação e da paz. Esta Páscoa repete-se todos os anos com maior solenidade no Tríduo Pascal, mas celebra-se também dominicalmente em cada Eucaristia.
A Páscoa vivida na Igreja é um acontecimento eminentemente religioso. É urgente redescobri-la, deitando para trás a ideia de uma páscoa social com férias de diversão fácil e despesas acumuladas. A Páscoa do cristão é vivida no acompanhar a Paixão, Morte e Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo.
2. O Mistério da Ressurreição de Cristo deve, porém, ser vivido numa perspectiva de mudança radical de vida. Os cristãos são responsáveis por um tempo novo que permita a todos os homens aproximarem-se da felicidade a que têm direito. Deve então redescobrir-se o mistério da Ressurreição, o que poderá exigir três dimensões fundamentais: a ressurreição pessoal, a ressurreição do mundo, a ressurreição da própria Igreja. Aqui, ressurreição significa recriar a própria vida, dar-lhe um sentido novo, levar a todos outras razões de esperança, abrir portas que façam os outros felizes.
• A ressurreição pessoal não consiste apenas na libertação do mal que qualquer tenha feito. Ressuscitar deve ser para cada um reencontrar o sentido da vida, descobrir a alegria de viver, estar preocupado com a felicidade dos outros, relativizar as coisas para melhor amar as pessoas, aceitar as perdas para ganhar a vida. Ser diferente, ser melhor, ser feliz.
• A ressurreição do mundo deverá ser uma normal preocupação dos homens de boa vontade. A humanidade deixou-se atolar nos conflitos, na incapacidade de diálogo, em jogos de interesses, na absolutização do ter e do poder, na facilidade excessiva nas mais diversas situações. Este mundo tem de abrir-se definitivamente à tolerância, à justiça, à entreajuda, à solidariedade, ao perdão, à reconciliação e à paz. Esta ressurreição pode viver-se na família, no lugar de trabalho, nas relações sociopolíticas. Esta ressurreição é uma urgência na construção do mundo novo.
• A ressurreição da Igreja torna-se um imperativo depois da chegada de Francisco, Papa. Na sua simplicidade, Francisco convida a Igreja a uma radical aproximação dos mais frágeis, ao respeito incondicional da natureza, e à transformação das próprias estruturas. Esta é uma proposta de renovação que, não sendo fácil, é a única que dá da Igreja uma nova imagem.
A Ressurreição Pascal que se celebra coincide com a vinda da Primavera. Será que os cristãos são capazes, na sua vida e na sua relação com os outros, de viver ao ritmo desta Primavera da Igreja?
3. A Comunidade Paroquial do Campo Grande é chamada à Ressurreição. Se as celebrações do Tríduo Pascal tivessem sido apenas rituais, tal revelaria não se ter entendido o que é ressuscitar. É a Paróquia, enquanto tal, que deve sentir uma vida nova à luz da Ressurreição de Cristo. Sugerem-se quatro pistas que podem renovar profundamente a nossa comunidade cristã.
• Relações humanas marcadas pela proximidade, a ternura e a comunhão, cultivando se necessário o perdão até à reconciliação total.
• A acção pastoral exigente, vivendo cada um a sua missão com competência, generosidade e estreita colaboração com todos.
• A resposta social com o cunho da universalidade, socorrendo todos os mais pobres e os que sofrem, com a dádiva de amor que cada partilha vai revelar.
• O ambiente na comunidade, pautado pela alegria. Não a alegria do barulho ruidoso, mas aquela que é dom do Espírito e torna cada um capaz de fazer os outros felizes.
É claro que a oração mais intensa e a Eucaristia celebrada na comunidade facilitarão estes pontos de esforço que aqui se sugerem para conseguir viver a Páscoa comunitária em estilo de Ressurreição.
Feliz Páscoa.