1. Quando eu era menino, chegando ao seminário com apenas 10 anos, fui surpreendido com dois textos da Sagrada Escritura que me marcaram profundamente. Um foi a narrativa da conversão de S. Paulo, o outro foi o chamamento de Samuel. Ao ouvir pela primeira vez estas narrativas, senti que tudo aquilo era comigo.
• Samuel tinha sido confiado por Ana, sua mãe, ao sumo sacerdote, Eli. Samuel sentia que o chamavam e julgava ser Eli a precisar dele. À terceira vez, o velho sacerdote disse a Samuel: se ouvires novamente a mesma voz responde, “falai Senhor que o vosso servo escuta”.
• Paulo perseguia os cristãos. Foi a Damasco, com cartas, para a todos fazer presos. No caminho, foi surpreendido por uma luz extraordinária. Caiu por terra e só pôde ouvir uma voz que lhe dizia “Saulo, Saulo, porque me persegues?” – “Quem és tu Senhor?”, conseguiu responder. E a voz fez-se ouvir de novo: “Sou Jesus a quem tu persegues.” A resposta de Saulo foi sinal de uma mudança radical: “Senhor, que queres que eu faça?”
• Estas histórias da Sagrada Escritura marcaram para sempre a minha vida. Também respondi no silêncio do primeiro retiro no seminário, “Falai Senhor, que o vosso servo escuta”. Um pouco mais velho também disse como Saulo: “Senhor, que queres que eu faça?”
São estas as linhas de força de um jovem que quer encontrar-se com o Senhor e dispor-se aos seus desafios. Foi isto que me levou a compreender a vida neste tempo de formação.
2. Foi nos seminários que me preparei para o sacerdócio. Compreendo que se perguntem sobre o que é o seminário e para que serve. Eu tinha a casa de meus pais, uma verdadeira escola de valores. O ambiente que ali vivia não era suficiente, porém, para aprofundar a vocação. Procurei, então, um lugar diferente, com muitos colegas e alguns sacerdotes que me acompanharam.
• O Seminário não é uma escola onde se aprendem as várias ciências do saber. Não é um lugar de afastamento onde se transforma a personalidade de um jovem. Não é um espaço onde só se reza e se aprende a obedecer a tudo, perdendo até a própria vontade. Não, o seminário não é nada disso.
• O Seminário é uma comunidade cristã, com aprendizagem, com experiências, com relações onde procuramos descobrir o essencial da vida de um jovem que um dia se sentiu atraído pelo sacerdócio. Aprendem-se imensas coisas, num estudo sistemático, fazem-se experiências extraordinárias da relação com Deus e com os outros, uma relação que permite alargar o coração e estar disponível para todos.
• Na arte do conhecer, o enriquecimento é enorme. Em humanidades não se estudam só português, latim e matemática. Em filosofia não se aprofundam apenas os autores cristãos. Em teologia confrontamo-nos com os diversos pensadores que nos falam de maneira diferente sobre Deus, Cristo, a Igreja, o Evangelho.
Foi num seminário de portas abertas, já lá vão mais de 70 anos, que me preparei para o sacerdócio. Recordar o tempo de seminário continua a ser para mim motivo de gratidão para com o Senhor que me chamou.
3. Qualquer sacerdote tem recordações inesquecíveis da sua passagem pelos seminários diocesanos. Ali tiveram professores que não podem esquecer. Ali conheceram colegas que marcaram profundamente a sua vida, ao longo dos anos, muitos deles companheiros de caminho na aventura pastoral. Também ali cruzaram a sua vida com outros alunos que, não se ordenando sacerdotes, são pessoas extraordinárias na sociedade. É por isso que nós, os sacerdotes, pedimos todo o apoio para estas comunidades onde muitos jovens se preparam para a missão sacerdotal, no seguimento incondicional de Cristo, o único Mestre.
Todos podem ajudar os seminários:
• Pela oração intensa, para que o Senhor dê à sua Igreja muitos e santos sacerdotes. Já o Senhor dizia: “A messe é grande, os operários são poucos. Pedi ao Senhor da messe que envie operários para a sua messe” (Lc 10, 2).
• Pela partilha fraterna de bens, contribuindo com generosidade para os encargos que os seminários comportam. Na semana dos seminários, mas não só, os cristãos devem ter consciência de que os seminários são de toda a comunidade e é esta que deve apoiá-los incondicionalmente.
• Pela concessão de bolsas de estudo e de outras formas que permitam exprimir quanto o seminário e os seus alunos são parte muito viva da Igreja Diocesana. Assim se revela o grande amor que se tem pelo sacerdócio.
Se conseguirmos viver estas três dimensões na relação com os seminários, de certeza que Deus nos ajudará a multiplicar o número dos ministros de Deus que irão presidir às nossas paróquias e a todas as outras iniciativas pastorais.
4. A Semana dos Seminários em 2013 tem um slogan de extraordinária beleza: “PARA QUE CRISTO SE FORME EM NÓS”. Este slogan contém 3 ideias que definem os seminários de hoje.
• É Cristo que nos convida. Não são as características humanas, de qualquer jovem, nem a simples orientação dos professores e directores espirituais, nem mesmo as inúmeras experiências pastorais que chamam qualquer ao sacerdócio. Só Cristo é que nos convida.
• Mas ELE FORMA-SE EM NÓS. É o mistério de uma nova encarnação. De facto, na vocação sacerdotal, é Cristo que chama, é Cristo que acompanha, é Cristo que desafia, é Cristo que forma.
• A expressão EM NÓS, deve ser transformada por cada sacerdote numa expressão diferente: “Já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim” (Gl 2, 20). De facto, cada sacerdote está sempre com a graça de Deus, a deixar-se cativar pelo Senhor que o convida a segui-l’O e a segui-l’O até ao fim.
É neste contexto que cada comunidade paroquial é chamada a contribuir para a formação dos sacerdotes como forma privilegiada de participar na vida da comunidade cristã.
5. Registo com alguma preocupação que a nossa comunidade paroquial do Campo Grande não esteja a “gerar” vocações para o sacerdócio. Temos mesmo o dever de pedir ao Senhor da messe que envie operários para a messe. Mas, temos simultaneamente, que pedir aos jovens e às famílias da nossa comunidade que se disponham a correr o risco da vocação na sua vida ou na vida dos seus filhos. Que Cristo, sacerdote, nos ajude.