1. É da tradição de todos os povos celebrar os grandes acontecimentos que marcam a sua história. Acontece, porém, que depois de uma grande festa nada se altera nos comportamentos humanos. Mantêm-se as rotinas, agravam-se às vezes as tensões, e, até, eventuais aproximações no dia da festa logo se desvanecem no rolar dos dias. É assim também com o Natal. Diz-se que é a festa da família, mas a comunhão entre todos em casa não acontece. É considerada festa das crianças, mas muitas delas continuam ao abandono. Há ceias de Natal para os sem-abrigo, mas estes continuam a dormir na rua. Há cabazes de Natal para as famílias mais pobres, mas o desemprego persiste em tantas casas que não têm o suficiente para sobreviver. Talvez por ser assim, tenham surgido desafios em pequenos slogans populares. Diz-se “é Natal sempre que o homem quiser”, mas muitas vezes o homem não quer mesmo. Também se diz que “todos os dias podem ser Natal”, mas do poder ao ser vai uma grande distância. Também há cristãos que referem o nascimento de Jesus em todos os lugares, mas há muitos corações onde Jesus não nasceu. Por tudo isso, depois do Natal há quase a sensação de que Jesus Menino foi levado para muito longe.
Para que Jesus possa estar bem presente no coração da humanidade a Igreja oferece ao mundo três datas muito significativas: o Dia Mundial da Paz (1 de Janeiro), o Dia da Epifania (6 de Janeiro) e o Dia do Baptismo do Senhor (no domingo a seguir).
• Para celebrar a paz o Papa Francisco vem dizer na sua mensagem que todos os humanos se devem libertar da escravidão em que possam estar envolvidos. O slogan é muito bonito: “já não escravos, mas irmãos”. Como seria maravilhoso repetir o apelo de Paulo ao seu amigo Filémon para receber o escravo Onésimo como irmão! De facto, só numa nova fraternidade universal será possível construir a paz.
• Para revelar a mensagem de Jesus como universal, isto é, dirigida a todos os povos, na narrativa evangélica os magos vêm de todos os continentes, são de todas as raças e têm todas as idades. Eles seguem a Estrela que é Cristo e Cristo, com a sua luz, pode iluminar o mundo inteiro.
• Para ser presença no coração do Mundo os cristãos baptizados tornam-se mensageiros da esperança. Acreditam mesmo que todas as dificuldades podem ser vencidas. Deverão assumir, porém, que a Boa Nova do Evangelho não chegará a toda a terra sem um empenhamento forte na nova evangelização.
Estas três festas na etapa final do ciclo litúrgico do Natal constituem um desafio pastoral que compromete quem quer ser cristão de verdade. Tem razão Jesus quando proclama “felizes os que constroem a paz, felizes os que lutam pela justiça, felizes os que sofrem perseguição por amor do meu nome” (cf Mt 5, 1-12).
2. O ponto de partida para continuar o Natal na cidade dos homens, pela acção dos cristãos, está no compromisso baptismal. O Baptismo não é um mero acto social. Quando se leva uma criança ao Baptismo, os pais assumem a responsabilidade de a educar na fé e no compromisso cristão. O Baptismo também não é apenas um acto religioso. Quando um adulto recebe o Baptismo não entra para uma religião; assume uma relação pessoal com Cristo que o convida a ir pelo mundo inteiro anunciar a Boa Nova. O Baptismo não pode ser visto somente como um sacramento de iniciação cristã, mas quem o celebra compromete-se a ser evangelizador. É por tudo isto que o Baptismo provoca um Natal continuado na vida do cristão e na cidade onde ele habita.
• O Baptismo é o sacramento da fé, da adesão incondicional à pessoa de Jesus. Quem o recebe passa a viver em comunhão plena com Jesus Cristo que não pode deixar de anunciar a todos aqueles que se cruzam consigo no caminho.
• O Baptismo é o sacramento do testemunho, e testemunhar é acolher, compreender, e ser solidário com todos, sobretudo com os mais pobres (cf EN 21). De facto, ninguém é baptizado para ganhar a salvação no fim dos tempos. Este é o sacramento que exige levar a mensagem de Jesus a toda a parte.
• O Baptismo é o sacramento da comunidade, que torna o cristão membro do Povo de Deus, que tem como cabeça Cristo, como condição a dignidade e a liberdade de todos os homens, como mandamento o amor, e como projecto a felicidade (cf LG 9). Se pelo Baptismo se entra na Igreja e a Igreja é sacramento universal de salvação, então o cristão coopera com Jesus na salvação de todos os homens.
Os rituais do Baptismo significam a purificação do coração na fonte baptismal, a iluminação da inteligência e da vontade na luz forte que vem do círio pascal, e o compromisso evangelizador no perfume que se mistura no óleo crismal. Com um coração novo, uma luz diferente e um compromisso eficaz é possível estar constantemente a afirmar o Natal, isto é, o nascimento de Jesus.
3. Para continuar a ser Natal ao longo do ano, o Papa Francisco deu-nos a receita. É com esta que vamos tentar viver na nossa acção pastoral até à Páscoa: “Natal és tu quando decides nascer de novo em cada dia e deixar entrar Deus na tua alma./ A árvore de Natal és tu, quando resistes vigoroso aos ventos e dificuldades da vida./ Os enfeites de Natal são tu, quando as tuas virtudes são cores que adornam a tua vida./ O sino de Natal és tu, quando chamas, congregas e tentas unir./ Também és luz de Natal quando iluminas com a tua vida o caminho dos outros com a bondade, a paciência, a alegria e a generosidade./ Os anjos de Natal são tu, quando cantas ao mundo uma mensagem de paz, de justiça e de amor./ A estrela de Natal és tu quando guias alguém ao encontro do Senhor. És também os Reis Magos, quando dás o melhor que tens sem importar a quem./ A música de Natal és tu quando conquistas a harmonia dentro de ti./ O presente de Natal és tu, quando és verdadeiramente amigo e irmão de todos os seres humanos./ O cartão de Natal és tu, quando a bondade está escrita nas tuas mãos./ As felicitações de Natal são tu, quando perdoas e restabeleces a paz, mesmo quando sofres./ A ceia de Natal és tu, quando sacias de pão e de esperança o pobre que está ao teu lado./ Tu és, sim, a noite de Natal, quando humilde e consciente, recebes no silêncio da noite o Salvador do mundo sem ruídos nem grandes celebrações; tu és sorriso de confiança e de ternura, na paz interior de um Natal perene que estabelece o Reino dentro de ti”.
4. Que o desafio baptismal e a proposta de Francisco, Papa, ajudem todos os membros da nossa comunidade paroquial, a fazerem Natal em todos os dias do ano.
Pe. Vítor Feytor Pinto - Prior