TEMPO DE TRANSFIGURAÇÃO – 1 de Março de 2015

1. Quem visita a Terra Santa, em peregrinação ou num simples passeio de férias, não pode deixar de subir ao Monte Tabor. Lá do alto poderá ver a planície de Jezreel onde se escreveram os mais importantes acontecimentos da história de todo o Povo Hebreu. Muitas das lutas ali travadas garantiram por muito tempo a independência de Israel. O Monte Tabor fica a meio caminho entre a Galileia e a Judeia. Jesus caminhava para Jerusalém com os seus discípulos, subiu então ao Monte, levando consigo Pedro, Tiago e João. Surpreendentemente, transfigurou-se perante eles.

• Jesus apareceu com todo o esplendor da sua divindade. Era importante que os discípulos O conhecessem, não apenas como filho do homem, mas também como Filho de Deus.

• De um e outro lado de Jesus estava Moisés e Elias. Assim se revelava que Jesus vinha cumprir toda a Lei e os Profetas. A promessa do Messias estava agora a cumprir-se.

• Ouviu-se então uma voz que dizia assim: “Este é o meu Filho muito amado em quem pus todo o meu encanto; escutai-O” (Mt 17, 5). Não bastaria, então, contemplar Jesus como Filho de Deus, mas era importante escutá-l’O, isto é, deixar-se transfigurar pela sua Palavra.

• Pedro ainda não entendera a mensagem e por isso queria ficar apenas com o conforto da presença de Jesus. Pedro disse então: como é bom estarmos aqui, façamos aqui três tendas, uma para ti, outra para Moisés e outra para Elias. Seria a inércia que não levaria a mensagem a ninguém.

• Porque tudo se desvaneceu, Jesus disse a Pedro e aos outros: “desçamos do monte e não contem nada a ninguém, até que Eu ressuscite dos mortos” (cf. Mt 17, 9). Era um apelo a prepararem-se para anunciarem a Boa Nova.

Esta é a lição do Segundo Domingo da Quaresma: reconhecer Jesus transfigurado como Filho de Deus, aceitar o desafio da Ressurreição e, depois, levar esta Boa Notícia a toda a criatura

2. Na Evangelii Gaudium o Papa Francisco diz expressamente que a renovação da Igreja é inadiável. Poderá dizer-se que renovar, transformar e transfigurar têm o mesmo sentido. Por isso mesmo, o empenho dos cristãos na Quaresma será conseguir as grandes transformações que, na Igreja e no mundo, são inadiáveis. Há 4 dinamismos nesta transfiguração: a renovação pessoal, a inovação social das comunidades cristãs, a transformação missionária da Igreja e a conversão do mundo.

• A renovação pessoal – o cristão vive a Quaresma numa preocupação constante de conversão. Por bom que se seja há sempre inúmeras situações que podem ser diferentes na relação com Deus e na relação com os outros. Mais fé e mais amor são sempre possíveis, por muito verdadeiro que seja o ser cristão.

• A inovação social – não há confissão de fé sem intervenção social, diz o Papa Francisco. As paróquias e outras comunidades celebram a fé na Eucaristia Dominical. E como vivem a intervenção social? É preciso saber onde estão os irmãos mais carenciados, ir ao seu encontro, sofrer com eles, e descobrir soluções para os seus problemas. Certamente que esta atitude de amor concreto vai despertar o outro para o encontro com Deus.

• A transformação missionária da Igreja – é este o tema mais querido do Papa Francisco. O Papa quer uma Igreja em saída, de portas abertas, que acolha a todos e vá ao encontro de todos anunciando a Pessoa de Jesus Cristo. “O sonho missionário deve chegar a todos” e é da responsabilidade de todos. Pelo testemunho cristão e pelo anúncio de Jesus, mesmo aos não crentes, cada cristão está comprometido na missão da Igreja.

• A conversão do mundo – já Pio XII dizia, em 1952, “que é necessário transformar o mundo de selvagem em humano, de humano em divino, isto é, segundo o querer de Deus” (11.2.1952). Passados tantos anos, as atitudes selvagens no mundo agravaram-se. Não basta a oração, é urgente a intervenção dos cristãos para garantir neste tempo a verdade, a justiça, a liberdade, o amor e a paz. (cf. PT João XXIII).

Não é no curto espaço de 40 dias, isto é, de uma Quaresma que se consegue toda esta transfiguração. É necessário porém, ter um projecto seguro, que a pouco e pouco se vai realizando. O ponto de partida é a mudança dos corações. O Papa Francisco recorda-o evocando a oração popular: “Jesus, manso e humilde de coração, fazei o meu coração semelhante ao vosso”. Acresce depois, a transfiguração das nossas comunidades, lugares de encontro para os mais pobres, e lugares de saída para ir ter com os “afastados”.

3. Cada comunidade cristã tem que descobrir a sua dinâmica própria na transfiguração necessária. Olhando para as Mensagens da Quaresma do Papa Francisco e do nosso Patriarca de Lisboa, não é difícil de descobrir linhas de rumo na transformação comunitária. Deixam-se alguns tópicos para a acção:

• A identidade cristã exige não ter medo da afirmação da fé em Jesus Cristo e dos valores que daí resultam para o comportamento no meio da cidade. Os cristãos não podem ter medo de ser diferentes.

• A certeza da misericórdia de Deus constitui sempre uma garantia de esperança. O salmista dizia que Deus é lento para a ira e rico em misericórdia (cf Slm 103, 8-9). Os cristãos, no entanto, sabem que Deus é Pai e por isso não se cansa de acolher, de compreender, de perdoar, de pedir sempre mais.

• A partilha de bens não se esgota na resposta a um pedido de auxílio; partilham-se os bens materiais mas têm de partilhar-se também os afectos, os conhecimentos, o tempo, o sorriso.

• A acção evangelizadora pede a sensibilidade de cada um. É tempo de descobrir em casa, na escola, no trabalho, ou no grupo social quem são os que estão mais longe e a quem é muito bom testemunhar e anunciar.

• O culto da alegria pascal faz parte também deste itinerário que como cristão cada um realiza. O Papa Francisco refere que tem de viver-se a Quaresma sob o signo da Alegria Pascal. Os cristãos deverão aparecer, então, felizes, porque se preparam para o acontecimento maior da sua vida litúrgica, celebrar a Ressurreição na Noite da Páscoa.

Durante este tempo de Quaresma ninguém pode estar indiferente nem a Deus, nem aos outros. Cada um deverá descobrir a melhor forma de se transformar, transformando com isso a Igreja e o mundo.

4. Os homens e mulheres do nosso tempo vivem momentos difíceis. Não é apenas a austeridade que os faz sofrer. Vivem-se tempos de rotura. As situações, as escolhas diferentes, os novos comportamentos sociais, a perda de valores, tudo isto no seu conjunto pede aos cristãos uma maior fidelidade. É nesta fidelidade a Jesus Cristo que se fundamenta toda a Transfiguração.

Pe. Vítor Feytor Pinto - Prior

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